terça-feira, 14 de junho de 2016

Angola. JÁ SE FALA EM GOLPE… MILITAR



O Fundo Petrolífero da Noruega, o maior fundo soberano do mundo, com 850 mil milhões de dólares, está a elaborar planos de contingência para se proteger de eventos políticos extremos, servindo de exemplo (isso é que era bom!) para Angola e Moçambique.

O departamento de gestão do banco central da Noruega, que gere o maior fundo soberano do mundo, explicou ao Financial Times (FT) que o fundo petrolífero “desenhou vários planos de contingência para cenários que podem representar uma ameaça para os activos do fundo”.

Embora escusando-se a elaborar sobre estes planos, o FT afirma que este fundo está a prestar assistência a outros fundos petrolíferos a nível mundial sobre como proteger os activos, principalmente em caso de eventos políticos extremos como invasões ou golpes militares.

Angola constituiu em 2012 um Fundo Soberano, dotando-o de 5 mil milhões de dólares e que é dirigido – mera coincidência, obviamente – por um filho de José Eduardo dos Santos, e Moçambique já afirmou estar a preparar a criação de um instrumento financeiro semelhante para quando as receitas da exploração e exportação do gás natural líquido começarem a entrar nos cofres do Estado, provavelmente no início da próxima década.

A Líbia, um país em profunda crise política e militar há cinco anos, está a servir de alerta para os gestores do fundo, porque há duas facções rivais que reclamam o controlo do Fundo que tem 66 mil milhões de dólares em activos.

Países africanos como Angola e o Zimbabué, que já detêm estes fundos, ou outros como Moçambique ou a Tanzânia, enfrentam grandes desafios políticos, comentou uma investigadora do departamento de políticas públicas na Universidade de Oxford.

“Preparar-se para um golpe de Estados e potencialmente perder a capacidade de gerir os activos é verdadeiramente importante por causa do que se passou na Líbia nos últimos cinco anos”, disse ao FT Angela Cummine, reconhecendo que “há uma boa razão para os fundos soberanos instalarem os activos fora do seu país de origem” e que “existe uma óptima relação de trabalho destes fundos com as capitais financeiras como Nova Iorque, Londres ou a Suíça”.

Destacando particularmente os fundos soberanos africanos como os mais problemáticos, Cummine exemplificou com o Zimbabué e Angola e lembrou que Moçambique e Tanzânia também já afirmaram querer estabelecer um instrumento financeiro semelhante para gerir a riqueza que virá da exploração dos recursos naturais.

Recorde-se que o Fundo Soberano de Angola tinha perdido cerca de 5% do valor injectado no primeiro semestre de 2015, tendo agora 4.829 milhões de dólares sob gestão de José Filomeno dos Santos, nomeado pelo Presidente da República, seu pai, para gerir o Fundo. Certamente que agora, com a irmão a gerir a Sonangol, Filomeno terá a vida – e as contas – mais descansada.

Recorde-se que o Fundo (do regime) gere o dinheiro do petróleo (do regime) teve prejuízos superiores a 15 milhões de dólares, montante que contrapõe com o lucro dos investimentos feitos que não chegam para cobrir as despesas.

O Fundo Soberano de Angola foi criado com o objectivo de investir domesticamente e no exterior do país os recursos gerados pelas exportações de petróleo, infra-estruturas e outros projectos tendentes a diversificar a economia angolana, fortemente dependente do petróleo.

Em meados de Abril último, vários órgãos de comunicação social – entre os quais o Folha 8 – noticiaram que Angola, através do Fundo Soberano, surgiu na investigação internacional aos paraísos fiscais, conhecida por “Papéis do Panamá”, factos negados – como é elementar – pela própria direcção do Fundo.

Em comunicado, o Fundo Soberano do regime disse ser “vítima de alegações infundadas”, garantindo que a legalidade das suas actividades vai ser “recomprovada” na próxima publicação do relatório de contas anual, “prática regulamentar observada” desde sempre.

Fundo sem fundo alimenta a corrupção

Éraro mas às vezes acontece. Em Setembro de 2015 a AFP (Agence France-Presse) descobriu a pólvora e disse: “A nomeação de um dos filhos do presidente José Eduardo dos Santos para o comando do Fundo Soberano, alimentado pelos recursos obtidos com o petróleo, mostra o controlo crescente da família presidencial sobre todas as esferas do poder”.

Ainda estava para chegar a nomeação de Isabel dos Santos para PCA da sonangol.

Que o clã de sua majestade o rei de Angola, José Eduardo dos Santos, domina o país, mas não só, todo o mundo sabe há muito tempo, embora seja uma verdade que está a ser escondida por todos os meios aos… angolanos. Ter mais de 60 por cento da população na miséria é, convenhamos, uma boa estratégia para manter o povo numa total ignorância.

E quando aparecem alguns angolanos que se recusam a ser escravos, a solução é metê-los na cadeia, dizer que fazem parte de um bando criminoso que, inclusive, pode evoluir para o terrorismo.

“Esta escolha confirma a omnipresença da família dos Santos em Angola, mas mostra também que a campanha para fazer do filho do Presidente o seu sucessor já começou”, disse há bem mais de um ano Marcolino Moco, ex-primeiro-ministro e uma das poucas figuras do partido no poder, o MPLA, que, embora correndo o risco de chocar com uma bala perdida, fala sobre a vida política, mostrando ser um Homem livre.

Dizia a AFP que “a imprensa angolana apenas comentou essa escolha, que foi anunciada num comunicado do Fundo Soberano após várias semanas de rumores, e a Presidência negou-se a fazer comentários a este respeito”.

Acrescentava a AFP que sua majestade o rei de Angola, que está há no poder desde 1979, controla totalmente o Exército, o partido maioritário e todas as instituições estatais.

Reconheça-se que, embora não sendo novidade, é sempre relevante, mesmo para os que são obrigados a pensar apenas com a barriga, que a esperança numa democracia e um Estado de Direito (algo que Angola não é de facto) vá sendo alimentada com verdades. Se assim não for, as mentiras oficiais acabarão por tornar-se “verdades”.

“No seu círculo mais íntimo, quase todos são membros da sua família: o seu vice-presidente, Manuel Vicente, considerado o número dois do regime, é o padrinho de sua filha mais velha, Isabel; e seu conselheiro económico, Armando Manuel, tornou-se em ministro das Finanças”, denunciava a AFP que, diga-se, não corre – pelo menos por enquanto – os riscos vividos diariamente desde 1995 por nós aqui no Folha 8.

“A lógica de José Eduardo dos Santos consiste em controlar o dinheiro para manter o poder, o que explica que coloque membros de sua família ou pessoas próximas em postos importantes, onde está a riqueza”, explicava, e bem, Justino Pinto de Andrade, outro dos (ainda) poucos angolanos mais susceptíveis a chocar com uma das muitas balas perdidas que enxameiam a nossa sociedade.

“A sua filha Isabel, conhecida como “princesa”, foi apresentada na lista da Forbes como a africana mais rica graças às suas participações em empresas angolanas e portuguesas”, relatava a AFP, recordando que “só em Angola, Isabel dos Santos possui 25% do capital do banco BIC, o que representa algo em torno de 160 milhões de dólares, e 25% do da Unitel, uma das duas empresas de telefonia do país, cerca de 1 bilhão de dólares, segundo a revista norte-americana”.

Por outro lado, a AFP dizia que “o seu irmão José Filomeno de Sousa dos Santos, mais conhecido como “Zenu”, assumiu a Presidência do Fundo Soberano criado em Outubro de 2012 com 5 bilhões de dólares para investir no desenvolvimento do país, e receberá 3,5 bilhões adicionais por ano procedentes dos recursos obtidos com o petróleo”.

Na inventariação dos proventos da família do Presidente, a France-Presse dizia também, à revelia das regras impostas pelo regime de sua majestade o rei que se diz transparente e democrático, que a “esposa do Presidente, a ex-aeromoça Ana Paula Cristóvão de Lemos dos Santos, controla várias empresas, principalmente de comércio de diamantes, enquanto uma ex-mulher de dos Santos, Maria Luísa Abrantes, dirigiu a poderosa Agência Nacional de Investimentos Privados (ANIP)”.

Citando de novo Justino Pinto de Andrade, a AFP escrevia que, “a partir de um certo volume de negócios, é impossível para um estrangeiro estabelecer-se no país sem que esteja ligado a alguém próximo ao poder. Todos os bancos, sem excepção, estão vinculados ao regime”.

“Membros da família presidencial estão presentes em todas as grandes empresas do país: Sonangol (petróleo), Endiama (diamantes), TAAG (companhia aérea). Mas o poder também consegue ter influência no mundo intelectual, sobretudo, por meio da Fundação José Eduardo dos Santos e da Fundação Lwini, da primeira-dama”, explicou Bernardo Tito, dirigente da CASA-CE.

A AFP considerava, vá lá saber-se com base em quê, que “a imprensa e a cultura também não escapam a este controlo. Outra filha do presidente, Welwitschia dos Santos – conhecida como “Tchizé” e casada com um empresário português – dirige uma rede de televisão pública (TPA 2) e duas revistas de celebridades”.

“Tchizé e o seu irmão José Paulino, “Coreon Du”, também presidem a uma das principais empresas de produção audiovisual do país, a Semba Comunicação, que elabora grande parte da publicidade e dos programas para a televisão pública”, contava a AFP que, citando o jornalista Fernando Baxi, acrescentava que “quanto mais tempo o seu chefe permanecer no poder, maior será a omnipresença da família”.

Quando chegou ao poder em 1979, sua majestade o rei José Eduardo dos Santos era marxista, formado na então União Soviética. A partir dessa altura renegou o marxismo e dedicou-se exclusivamente ao… enriquecimento.

Segundo o director da Open Society Initiative da África do Sul, José Eduardo dos Santos passou a controlar vários “inimigos pessoais – generais, polícias, políticos – oferecendo-lhes diamantes, empresas e riqueza”.

Ainda de acordo com as suas palavras, sua majestade o rei de Angola “criou um sistema de sucção de sangue, no qual ele é a veia principal. Eles não podem deixá-lo ir. Uma sanguessuga não pode sobreviver se a veia principal não estiver lá”.

Folha 8

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