segunda-feira, 12 de agosto de 2013

NOVAS VOZES NO BRASIL – Lula da Silva

 


Lula da Silva* - Diário de Notícias, opinião
 
A juventude, conectada nas redes sociais e com os dedos ágeis nos seus telemóveis, tem saído às ruas para protestar em diversas regiões do mundo.
 
Parecia mais fácil explicar as razões de tais protestos quando eles aconteciam em países sem democracia, como o Egito e a Tunísia em 2011, ou onde a crise económica levou o desemprego juvenil a níveis assustadores, como na Espanha e na Grécia, por exemplo. Mas a chegada dessa onda a países com governos democráticos e populares, como o Brasil, quando temos as menores taxas de desemprego da nossa história e uma inédita expansão dos direitos económicos e sociais, exige de todos nós, líderes políticos, uma reflexão mais profunda.
 
Muitos acham que esses movimentos significam a negação da política. Eu acho que é justamente o contrário: eles indicam a necessidade de se ampliar ainda mais a democracia e a participação cidadã. De renovar a política, aproximando-a das pessoas e de suas aspirações quotidianas.
 
Eu só posso falar com mais propriedade sobre o Brasil. Há uma ávida nova geração em meu país, e eu creio que os movimentos recentes são, em larga medida, resultado das conquistas sociais, económicas e políticas obtidas nos últimos anos. O Brasil conseguiu na última década mais que dobrar o número de estudantes universitários, muitos deles vindos de famílias pobres. Reduzimos fortemente a pobreza e a desigualdade. São grandes feitos, mas é também absolutamente natural que os jovens, especialmente aqueles que estão obtendo o que seus pais nunca tiveram, desejem mais.
 
Estes jovens tinham 8, 10, 12 anos quando o partido que eu ajudei a criar, o PT, junto com seus aliados, chegou ao poder. Não viveram a repressão da ditadura nos anos 60 e 70. Não viveram a inflação dos anos 80, quando a primeira coisa que fazíamos ao receber um salário era correr para um supermercado e comprar tudo o que fosse possível antes que os preços subissem no dia seguinte. Também têm poucas lembranças dos anos 90, quando a estagnação e o desemprego deprimiam o nosso país. Eles querem mais. E é compreensível que seja assim. Tiveram acesso ao ensino superior, e agora querem empregos qualificados, em que possam aplicar o que aprenderam nas universidades. Passaram a contar com serviços públicos de que antes não dispunham, e agora querem melhorar a sua qualidade. Milhões de brasileiros, inclusive das classes populares, puderam comprar o seu primeiro carro e hoje também viajam de avião. A contrapartida, no entanto, deve ser um transporte público eficiente e digno, que facilite a mobilidade urbana, tornando menos penosa e stressante a vida nas grandes cidades.
 
Os anseios dos jovens, por outro lado, não são apenas materiais. Também querem maior acesso ao lazer e à cultura. E, sobretudo, reclamam instituições políticas mais transparentes e limpas, sem as distorções do anacrónico sistema partidário e eleitoral brasileiro, que até hoje não conseguiu reformar--se. É impossível negar a legitimidade de tais demandas, mesmo que não seja viável atendê-las todas de imediato. É preciso encontrar fontes de financiamento, estabelecer metas e planear como elas serão gradativamente alcançadas.
 
A democracia não é um pacto de silêncio. É a sociedade em movimento, discutindo e definindo suas prioridades e desafios, almejando sempre novas conquistas. E a minha fé é que somente na democracia, com muito diálogo e construção coletiva, esses objetivos podem ser alcançados. Só na democracia um índio poderia ser eleito Presidente da Bolívia, e um negro Presidente dos Estados Unidos. Só na democracia um operário e uma mulher poderiam tornar-se Presidentes do Brasil.
 
A história mostra que, sempre que se negou a política e os partidos, e se buscou uma solução de força, os resultados foram desastrosos: guerras, ditaduras e perseguições de minorias. Todos sabemos que, sem partidos, não pode haver verdadeira democracia. Mas cada vez fica mais evidente que as nossas populações não querem apenas votar de quatro em quatro anos, delegando o seu destino aos governantes. Querem interagir no dia a dia com os governos, tanto locais quanto nacionais, participando da definição das políticas públicas, opinando sobre as principais decisões que lhes dizem respeito.
 
Em suma: não querem apenas votar, querem ser ouvidas. E isso constitui um tremendo desafio para os partidos e os lideres políticos. Supõe ampliar as formas de escuta e de consulta, e os partidos precisam dialogar permanentemente com a sociedade, nas redes e nas ruas, nos locais de trabalho e de estudo, reforçando a sua interlocução com as organizações dos trabalhadores, as entidades civis, os intelectuais e os dirigentes comunitários, mas também com os setores ditos desorganizados, que nem por isso têm carências e desejos menos respeitáveis.
 
E não só em períodos eleitorais. Já se disse, e com razão, que a sociedade entrou na era digital e a política permaneceu analógica. Se as instituições democráticas souberem utilizar criativamente as novas tecnologias de comunicação, como instrumentos de diálogo e participação, e não de mera propaganda, poderão oxigenar - e muito - o seu funcionamento, sintonizando-se de modo mais efetivo com a juventude e todos os setores sociais.
 
No caso do PT, que tanto contribuiu para modernizar e democratizar a política brasileira e que há dez anos governa o meu país, estou convencido de que ele também precisa renovar-se profundamente, recuperando seu vínculo quotidiano com os movimentos sociais. Dando respostas novas a problemas novos. E sem tratar os jovens com paternalismo.
 
A boa notícia é que os jovens não são conformistas, apáticos, indiferentes à vida pública. Mesmo aqueles que hoje acham que odeiam a política, estão começando a fazer política muito antes do que eu comecei. Na idade deles, não imaginava tornar-me um militante político. E acabámos criando um partido, quando descobrimos que no Congresso Nacional praticamente não havia representantes dos trabalhadores. Inicialmente não pensava em me candidatar a nada. E terminei sendo Presidente da República. Conseguimos, pela política, reconquistar a democracia, consolidar a estabilidade económica, retomar o crescimento, criar milhões de novos empregos e reduzir a desigualdade no meu país. Mas claro que ainda há muito a ser feito. E que bom que os jovens queiram lutar para que a mudança social continue e num ritmo mais intenso.
 
Outra boa notícia é que a Presidente Dilma Rousseff soube ouvir a voz das ruas e deu respostas corajosas e inovadoras aos seus anseios. Propôs, antes de mais nada, a convocação de um plebiscito popular para fazer a tão necessária reforma política. E lançou um pacto nacional pela educação, a saúde e o transporte público, no qual o Governo federal dará grande apoio financeiro e técnico aos estados e munícipios.
 
Quando falo com a juventude brasileira e de outros países, costumo dizer a cada jovem: mesmo quando você estiver irritado com a situação da sua cidade, do seu estado, do seu país, desanimado de tudo e de todos, não negue a política. Ao contrário, participe! Porque o político que você deseja, se não estiver nos outros, pode estar dentro de você.
 
Exclusivo Diário de Notícias/The New York Times
 
* EX-PRESIDENTE DO BRASIL. TRABALHA COM INICIATIVAS GLOBAIS NO INSTITUTO LULA
 

MÉDICOS PORTUGUESES PREFERIDOS PARA TRABALHAR NO BRASIL

 


Diário de Notícias - Lusa
 
O Ministério da Saúde do Brasil divulgou que entre os 521 médicos estrangeiros selecionados para o programa Mais Médicos, a maioria é de portugueses, espanhóis e argentinos, segundo o portal de notícias G1.
 
Dos 715 escolhidos para o programa, 194 são brasileiros que estudaram fora do Brasil e 521 são estrangeiros, sendo a maioria dos selecionados de Portugal, Espanha e Argentina.
 
O contrato firmado entre os médicos e o Governo brasileiro terá validade de dois anos e o salário, em média, será de 3.300 euros, podendo ser ainda mais alto nas áreas de difícil acesso, divulgou no sábado o Ministério brasileiro.
 
No total, foram selecionados candidatos com registos de 50 países diferentes e designados para atuar em 268 municípios brasileiros, segundo o Ministério da Saúde do Brasil, referiu o portal de notícias.
 
O Ministério da Saúde referiu que os selecionados, que vão trabalhar no Sistema Único de Saúde (SUS/sistema público), serão integrados no programa Mais Médicos, que visa ampliar o número de profissionais em municípios do interior e na periferia das grandes cidades.
 
Os médicos estrangeiros poderão exercer no Brasil sem fazer o exame de validação do diploma de medicina, o Revalida, mas só terão autorização para trabalhar na rede pública de saúde e em unidades específicas.
 
Os estrangeiros escolhidos têm até segunda-feira para comunicar se aceitam ou não a cidade para a qual foram selecionados.
 
Pelas regras do programa, os profissionais passarão por um período de três semanas de preparação no Brasil antes de começar a trabalhar, o que deve acontecer ainda em setembro.
 
Durante a preparação, terão aulas de português, vão estudar o SUS, os procedimentos e medicamentos usados na saúde pública brasileira, e estarão sob avaliação.
 
Cumprida essa etapa, os estrangeiros poderão iniciar o trabalho.
 
Cada médico terá um supervisor vindo de uma universidade federal que fará visitas periódicas - ainda não há definição sobre a frequência desses encontros. O supervisor também ficará à disposição para tirar dúvidas por telefone ou internet, segundo o Ministério da Saúde brasileiro.
 
O programa Mais Médicos teve a procura de 15.460 médicos para 3.511 cidades.
 
Só 938 profissionais brasileiros (6% do total) demonstraram interesse no programa na sua primeira etapa, número que deve aumentar com as próximas etapas de seleção.
 
A decisão de contratar médicos estrangeiros é polémica e gerou contestações por parte de entidades médicas, inclusivamente na Justiça, que negou alguns pedidos para suspender o programa.
 
A medida provisória que criou o Mais Médicos está em debate no Congresso Nacional.
 

BRASILEIROS APROVAM CONTRATAÇÃO DE MÉDICOS ESTRANGEIROS

 

Pragmatismo Político
 
Aumenta aprovação à contratação de médicos estrangeiros no Brasil. Pesquisa revela que 54% dos brasileiros são favoráveis ao projeto do governo federal de trazer médicos para trabalhar em regiões onde faltam profissionais de saúde
 
Aumentou a aprovação à contratação de médicos estrangeiros no Brasil, uma das medidas previstas pelo programa do governo federal Mais Médicos, revela pesquisa Datafolha.
 
Segundo o levantamento, feito entre quarta e sexta-feira da semana passada, 54% dos entrevistados são favoráveis ao projeto do governo federal de trazer médicos para trabalhar em regiões onde faltam profissionais de saúde.
 
No fim de junho, o índice de aprovação era de 47%. Da mesma forma, 48% eram contrários ao projeto na pesquisa de junho –agora, esse percentual caiu para 40%.
 
PERFIL
 
De maneira geral, quem apoia a vinda de médicos estrangeiros é homem (59%), tem ensino fundamental (54%) e avalia bem o governo federal (63%).
 
A maioria (60%) vive no Nordeste do país, principalmente em em cidades de médio porte –entre 50 mil e 200 mil habitantes (60%).
 
Os maiores críticos ao projeto são com ensino superior (52%), avaliam como ruim ou péssima a gestão da presidente Dilma Rousseff (52%) e moram em cidades grandes, acima de 500 mil habitantes (46%).
 
PROGRAMA
 
Lançado em julho pela presidente Dilma Rousseff, o Mais Médicos tinha dois eixos. O primeiro é fixar médicos, brasileiros ou estrangeiros, na rede pública de saúde de municípios do interior e periferias das grandes cidades. O segundo é ampliar o curso de medicina em dois anos,
 
Após a primeira fase, que se destinava a médicos formados no Brasil ou que já têm autorização para atuar no país, ter atendido apenas 6% da demanda dos municípios, foram abertas as inscrições para médicos que atuam no exterior.
 
Os médicos estrangeiros deverão passar três semanas sob avaliação de uma universidade antes de trabalhar.
 
Folha Online
 

NO BRASIL, KERRY TENTA AMENIZAR MAL-ESTAR DIPLOMÁTICO

 

Deutsche Welle
 
Secretário de Estado americano visita Brasil pela primeira vez em momento delicado da relação entre os dois países e tenta aliviar tensão antes da viagem que Dilma fará aos EUA para se reunir com Obama.
 
O chanceler Antonio Patriota recebe nesta terça-feira (13/08) em Brasília o secretário de Estado americano, John Kerry, que faz sua primeira viagem à América do Sul no cargo. A visita acontece num momento delicado da relação entre os dois países, arranhada nas últimas semanas pela controvérsia em torno do caso Edward Snowden e do megaesquema de espionagem dos EUA.
 
Temas comerciais também estarão em pauta, assim como outras questões bilaterais sensíveis. Mas, de acordo com fontes oficiais, os dois ministros devem centrar as conversas no tema espionagem a brasileiros, que poderia gerar mal-estar durante a visita da presidente Dilma Rousseff a Washington em 23 de outubro. Ela será recebida pelo presidente Barack Obama com honrarias militares e um jantar de gala.
 
“Não há somente este ponto crítico. Existem outros pontos que estão há muito tempo na pauta dos dois países e que não tiveram o devido encaminhamento até agora. Como exemplo, existe a liberalização da exigência de vistos”, diz Virgílio Arraes, professor de História Contemporânea da UnB. “A questão do monitoramento de dados no Brasil é mais um conflito que se soma, mas não é o único ponto de tensão entre os dois países.”
 
As denúncias de que Agência de Segurança Nacional americana (NSA, em inglês) teria espionado em larga escala e-mails e telefonemas de cidadãos e instituições brasileiros geraram uma forte reação do governo Dilma, que pediu explicações à Casa Branca e, junto com seus parceiros do Mercosul, levou o caso às Nações Unidas.
 
Em 20 de julho, o vice-presidente dos EUA, Joe Biden, ligou para Dilma, a quem prometeu dar “informações complementares” sobre o incidente e lamentou a “repercussão negativa” da revelação de espionagem.
 
Por causa das acusações feitas pelo ex-técnico da CIA, o Congresso brasileiro iniciou uma investigação e ouviu na semana passada o jornalista Glenn Greenwald, colunista do jornal britânico The Guardian e a quem Snowden entregou vários documentos com informações sigilosas sobre as ações da NSA.
 
Greenwald disse que os EUA usam os dados eletrônicos e telefônicos interceptados não só para combater o terrorismo, mas também para obter vantagens comerciais e industriais, como na área de energia e petróleo e, desta forma, ganhar mais poder através da obtenção de dados sobre negociações econômicas, estratégicas políticas e competitividade de empresas.
 
Vistos também em pauta
 
As denúncias de espionagem abalaram a agenda positiva entre os dois países e alguns assuntos são considerados travados, como o fim da obrigação de visto dos EUA para viajantes brasileiros, que poderia ser anunciado durante a visita de Dilma a Obama em outubro.
 
O Chile, por exemplo, já foi incluído no programa de isenção de vistos ao aceitar compartilhar base de dados de segurança com os americanos. “No caso do Brasil, isso também não afetaria a soberania do país, já que outros países seguem esse protocolo, que inclusive contempla a reciprocidade”, afirma Arraes.
 
Antes de chegar a Brasília, o secretário de Estado dos EUA, John Kerry, passou nesta segunda-feira pela Colômbia. Entre os assuntos em pauta com o presidente Juan Manuel Santos e a chanceler María Ángela Holguín, temas de interesse bilateral, as negociações de paz com as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc) e a Aliança do Pacífico.
 
Os EUA têm o interesse de participar como observador do bloco econômico, que foi lançado em junho de 2012 por Chile, Peru, Colômbia e México – países que somam 206 milhões de habitantes e um Produto Interno Bruto (PIB) de mais de 2 trilhões de dólares, o que representa cerca de 35% de toda a riqueza da América Latina e mais de 55% das exportações da região.
 
Brasil e Colômbia são os mesmos países que receberam a visita do vice-presidente americano, Joe Biden, em sua viagem à América do Sul no final de maio deste ano. Em seu segundo mandato, Obama pretende se reaproximar de países da América Latina para reforçar os laços políticos e econômicos.
 

DEMOCRACIA X CAPITALISMO

 


Emir Sader – Carta Maior, em Blog do Emir
 
O povo brasileiro tem demonstrado claramente, e de forma democrática, pelo voto, o que ele quer: a continuidade dos governos do Lula e da Dilma. No entanto, o governo sente dificuldades para dar continuidade a esses governos, aprofundando e estendendo as transformações da década passada.

Porque o Estado não dispõe, por si só, dos recursos suficientes para dinamizar a economia. O governo depende dos investimentos privados e estes se recusam a se adequar ao que politicamente o povo deseja. Preferem permanecer na especulação financeira interna e na exportação de capitais para os paraísos fiscais.

Essa a contradição entre democracia e capitalismo. A vontade popular é uma, mas os recursos para concretizá-la são apropriados privadamente pelos grandes empresários. Estes demandam condições impossíveis do governo para investir.

A saída tem que vir dos investimentos estatais, que só podem provir de uma profunda reforma tributária, que faça com que os que têm mais paguem mais, propiciando ao Estado os recursos para se responsabilizar pela concretização da vontade popular. A democracia se choca frontalmente com o mecanismo fundamental do capitalismo – a apropriação privada do excedente e sua aplicação somente em condições imensamente favoráveis à multiplicação do lucro.

A forma de superação atual da contradição só pode vir de um papel muito mais ativo e substancial do Estado na economia, não apenas com formas de regulação e incentivo, mas também como investidor fundamental. Para isso, precisa drenar recursos pela via da tributação, de uma profunda reforma socialmente justa dos impostos.

A estrutura tributária é extremamente injusta. Há muito mais impostos indiretos – pagos por todos de forma igual – do que impostos diretos. As grandes empresas conseguem formas de pagar pouco ou simplesmente não pagar impostos.

Quando se fala de reforma tributária, os grandes empresários imediatamente pensam em pagar menos impostos. Mas são beneficiários de infindáveis vantagens, entre créditos subsidiados, isenções, subsídios, etc.

Sem uma profunda reforma tributária socialmente justa, redistributiva, as grandes transformações que o Brasil precisa não serão viáveis. E, para isso, provavelmente só mesmo uma Assembleia Constituinte, com ampla participação popular.
 

“FIQUE LONGE DOS EUA”, ACONSELHA ADVOGADO DE ASSANGE A SNOWDEN

 

Deutsche Welle
 
Representante do fundador do Wikileaks, Michael Ratner afirma que Snowden errou ao não buscar refúgio inicialmente na Venezuela. Para ele, o julgamento de Bradley Manning foi injusto e manda um sinal ao delator da NSA.
 
Para Michael Ratner, advogado de Julian Assange nos Estados Unidos, o julgamento do soldado Bradley Manning enviou uma mensagem clara: a Justiça americana trata os dois – e o Wikileaks – como parte de uma única conspiração. E vai fazer o possível para colocá-los atrás das grades.
 
Em entrevista à DW Brasil, Ratner admite que Assange e o Wikileaks estão ajudando como podem Edward Snowden, atualmente em asilo na Rússia, mas nega o estar representantando juridicamente. Ele deixa, no entanto, um conselho ao delator do megaesquema de espionagem da Agência de Segurança Nacional: "Fique longe dos EUA".
 
Deutsche Welle: O Wikileaks e Julian Assange vêm ajudando Edward Snowden. Você também representa Snowden?
 
Michael Ratner: Não, nós não representamos Snowden. Julian, é claro, adotou uma posição de bastante princípio sobre o caso. Como você disse, ele vem sendo aconselhado por Julian e tem uma pessoa do Wikileaks, Sarah Harrison, o acompanhando.
 
O que você aconselharia a Snowden se você fosse o advogado dele?
 
Desde o início, eu teria ido imediatamente para outro país que não fosse China e Hong Kong. Talvez, eu teria ido para a Venezuela. E, agora, os EUA seriam o último lugar para onde eu iria. Viu-se como Bradley Manning foi tratado: ele vai passar provavelmente um longo período na prisão. As condições em que ele está preso são conhecidas e sabe-se quão injusto foi seu processo.
 
Também é possível ver que Julian Assange está praticamente preso numa embaixada, vivendo com o medo de ser extraditado para os EUA, de não obter fiança, de não ter contato com o mundo exterior e de se submeter a um processo injusto. Assim, o melhor conselho que eu poderia dar a Edward Snowden é: fique longe dos EUA.
 
Que recado o veredicto de Bradley Manning manda para Assange?
 
Durante o julgamento, Wikileaks e Julian Assange foram mencionados diversas vezes. Todos os dias, eles queriam denegrir a imagem do Wikileaks e de Assange ou dizer que eles foram, praticamente, cúmplices de Bradley Manning. E há um esforço para diferenciar WikiLeaks e Julian Assange do jornal New York Times.
 
A única forma que eles têm para pegar o Wikileaks e Julian Assange é de alguma forma dizer que eles não são jornalistas, que não são como o New York Times. Os promotores sabem que têm um problema. Eles talvez queiram processar os editores por espionagem, mas, pelo menos por agora, parece que isso seria inaceitável nos EUA.
 
Essa foi uma parte assustadora do processo, porque eles estão, claramente, atrás de Assange e do Wikileaks. O recado do julgamento é o seguinte – levando em conta que para eles Assange e o Wikileaks são conspiradores: uma parte da conspiração foi condenada. Se eles não tivessem conseguido isso, naturalmente, um processo contra o Wikileaks ficaria muito mais difícil.
 
Só para esclarecer: nos EUA, nunca houve investigação por espionagem contra jornalistas. Por esse motivo, você acha que na possível queixa contra Assange está escrito que ele não é jornalista, para que ele possa ser processado. Certo?
 
Exatamente. Eles vão alegar que Julian Assange é um ativista e que as pessoas do Wikileaks não se encaixam na imagem que os poderosos têm de jornalistas. Até mesmo alguns dos grandes órgãos de comunicação tentam, desde então, distanciar-se de Assange. O Ministério Público dos EUA tentará fazer com que um processo contra um editor se torne aceitável para os cidadãos americanos.
 
Há mais de um ano, Julian Assange não pode deixar a Embaixada do Equador em Londres. Você está otimista sobre o destino dele num futuro próximo?
 
Otimista? Não sei. Ele acredita que não vai ficar lá por mais um ano. O ponto decisivo para Assange é obter uma garantia da Suécia e/ou do Reino Unido de que ele não será extraditado imediatamente para os EUA quando ele deixar a embaixada. O problema dele não é a Suécia. Ele está disposto a enfrentar as alegações de assédio sexual. Mas o problema é que, quando ele for para a Suécia, muito provavelmente um bilhete somente de ida para os EUA estará esperando por ele.
 
Mas qual a possibilidade de que a Suécia e o Reino Unido, com suas estreitas relações com os EUA, possam garantir que ele não será extraditado?
 
Até agora, eles não deram nenhuma garantia. O Reino Unido é muito próximo dos EUA, e também a Suécia. Os suecos fazem praticamente tudo que os EUA querem. Ou seja, nesse ponto, ambos os países têm um problema. E no caso de Edward Snowden, vimos o que é preciso para desafiar os EUA. Edward Snowden teve de fugir para um país que estava disposto a enfrentar os EUA. E a Rússia estava, em grande parte, disposta a tal.
 
O que acha que vai acontecer a Snowden?
 
Minha esperança para Edward Snowdern é de que ele possa viajar para um país de sua escolha. No momento, esse país parece ser em primeiro lugar a Venezuela. O problema de Snowden é que será difícil chegar à Venezuela a partir da Rússia, sem que Washington obrigue o avião a aterrissar à força nos EUA. Essa é a situação dele agora. Mas ao mesmo tempo, ele é ao menos um homem livre, comparado com aquilo que poderia acontecer a ele numa prisão secreta americana.
 

O LADO MAIS SUJO DA MONSANTO

 


Para impor seus produtos em todo o mundo, empresa mobiliza agências de espionagem norte-americanas, vigia cientistas e dispara ataques cibernéticos
 
Marianne Falck, Hans Leyendecker e Silvia Liebrich, no Süddeutsche Zeitung - Tradução: Regina Richau Frazão - Imagem: Eric Drooker – em Outras Palavras
 
O grupo americano Monsanto (1) é um gigante no agronegócio – e é o número um na área da controvertida tecnologia genética “verde”. Para seus opositores, a Monsanto é um inimigo assustador. E continuam acontecendo coisas intrigantes que fazem o inimigo parecer ainda mais aterrorizante.
 
No mês passado, a organização europeia protetora do meio ambiente “Amigos da Terra” e a Federação para meio Ambiente e Proteção à Natureza Deutschland (BUND) quiseram apresentar um estudo sobre os efeitos do herbicida glifosato no corpo humano. Os herbicidas que contêm glifosato são carros-chefes da Monsanto. A empresa fatura mais de dois bilhões de dólares somente com o agente Roundup. Os “herbicidas Roundup”, assim sustenta a Monsanto, “têm uma longa história de uso seguro em mais de 100 países”.
 
Quando os vírus atacaram seus computadores, os ativistas se indagaram: será que estamos vendo fantasmas?
 
Entretanto existem também pesquisas alegando que o agente possivelmente cause prejuízos a plantas e animais; e o estudo mais recente demonstra que muitos moradores de grandes cidades vivem com o veneno no próprio corpo, sem terem conhecimento disso. Como tantas outra coisas relacionadas a esse assunto, é discutível o que exatamente o pesticida é capaz de provocar no organismo humano.
 
Dois dias antes da publicação do estudo em dezoito países, um vírus paralisou o computador do principal organizador, Adrian Bepp. Houve ameaça de cancelamento das entrevistas coletivas em Viena, Bruxelas e Berlin. “Surgiu pânico”, lembra Heike Moldenhauer da BUND. Os ativistas do meio ambiente viram-se correndo contra o tempo.
 
Moldenhauer e seus colegas tinham feito diversas especulações sobre os motivos e a identidade do misterioso agressor. A especialista em tecnologia genética do BUND acredita que o principal objetivo do desconhecido fornecedor do vírus tenha sido “gerar confusão”. Não há nada pior para uma pesquisa do que cancelar uma coletiva da imprensa. “E nós ficamos nos perguntando se estávamos vendo fantasmas”, diz Moldenhauer.
 
Não há nenhum indício de que Monsanto tenha sido o fantasma, ou que tenha algo a ver com o vírus. O grupo sustenta que não faria algo assim. Preza “agir com responsabilidade”: “hoje em dia é muito fácil fazer uma afirmação e de difundi-la”, diz a Monsanto. Dessa forma, prossegue “periodicamente são feitas afirmações duvidosas e populistas que denigrem nosso trabalho e nossos produtos, carecendo de qualquer abordagem científica.”
 
Os críticos do grupo têm outra visão. Ela tem a ver com a espessa trama tecida ao redor do mundo pela Monsanto, cujos entroncamentos estão localizados nos serviços secretos norte-americanos, nas suas forças armadas, em empresas de segurança privadas e, é claro, também junto ao governo dos EUA.
 
Um número expressivo de críticos da Monsanto relata ataques cibernéticos regulares, praticados com gabarito profissional. Também os serviços secretos e o serviço militar gostam de contratar hackers e programadores. Estes são especialistas em desenvolver cavalos de tróia e vírus para penetrar em redes de computadores alheios. O ex-agente da CIA Edward Snowden chamou atenção ao nexo entre as ações dos serviços de notícias e as movimentações da economia. No entanto, esta ligação perdeu força diante das demais denúncias.
 
Alguns dos poderosos defensores da Monsanto entendem bastante do assunto da guerra cibernética. “Imagine a internet como uma arma que está sobre a mesa. Ou você a pega, ou seu concorrente irá fazê-lo, mas alguém será morto”, foi o que disse Jay Byrne em 2001, quando era chefe de relações públicas na Monsanto.
 
É comum empresas lutarem com métodos escusos em função daquilo que consideram como seu direito, como sendo o certo. Porém, os termos “amigo ou inimigo”, “ele ou eu” já denotam linguagem de guerra. E numa guerra é preciso ter aliados – por exemplo, aqueles instalados no serviço secreto.
 
São conhecidos os contatos da Monsanto com o notório ex-agente secreto Joseph Cofer Black, que colaborou na formulação da “lei da selva”, na “campanha anti-terror” de George W. Bush. Ele é especialista para trabalho sujo, da linha dura. Trabalhou para a CIA durante quase trinta anos, sendo inclusive o chefe “antiterrorista”. Mais tarde seria o vice-presidente da empresa de segurança particular Blackwater, que mandou milhares de mercenários para o Iraque e o Afeganistão.
 
Pesquisas mostram como são estreitos os laços da direção da empresa com o governo central em Washington e com representações diplomáticas dos EUA no mundo inteiro. A Monsanto tem auxiliares eficazes em diversos lugares. Antigos colabores da corporação ocupam altos postos nos EUA, em departamentos governamentais e ministérios, em federações da indústria e universidades. Por vezes, são relações quase simbióticas. De acordo com informações da organização anti-lobby Open Secrets, no ano passado 16 lobistas da Monsanto ocuparam cargos de alto nível no governo norte-americano e em agências reguladoras.
 
Para a empresa, trata-se de ocupar novos mercados e em vender alimentos a uma população mundial que cresce em ritmo alucinante. A engenharia genética e as patentes relacionadas com plantas desempenham um papel importante nesse contexto. Nos Estados Unidos, o milho e soja geneticamente modificados representam 90% dos cultivos — e este percentual cresce de modo constante também no resto do mundo.
 
Apenas no mercado europeu, nada acontece. Diversos países da União Europeia (UE) têm muitas restrições com relação ao futuro da Monsanto, o que visivelmente desagrada ao governo dos EUA. No ano de 2009, Ilse Aigner, Ministra da Alimentação, Agricultura e Proteção ao Consumidor da Alemanha, filiada ao Partido da União Social-Cristã, havia banido o tipo de milho MON810 também dos campos alemães. Ao viajar logo depois para os Estados Unidos, foi interpelada pelo colega americano Tom Vilsack, com respeito à Monsanto. O político, do Partido Democrata, havia sido governador no estado federal Iowa, de característica rural, e logo tornou-se adepto dos transgênicos. Em 2001, foi eleito pela bioindústria como “governador do ano”.
 
Infelizmente, não há registro da conversa entre Vilsack e Aigner. Dizem que foi controvertida. Um representante do governo federal alemão descreve o tom do diálogo da seguinte forma: houve “esforços maciços de forçar uma mudança de rumo dos alemães com respeito à política genética” . A fonte da informação não quis se pronunciar sobre o tipo dos “esforços maciços”, nem sobre a tentativa de “forçar” alguma coisa. Isto não se faz entre amigos ou parceiros.
 
Graças a Snowden e ao Wiki-Leaks, o mundo pode imaginar o que acontece entre amigos e parceiros, quando o poder e o dinheiro estão em jogo. Dois anos atrás, o Wikileaks publicou despachos diplomáticos, que incluíam detalhes sobre a Monsanto e a engenharia genética.
 
Em 2007, por exemplo, o então embaixador norte-americano em Paris, Craig Stapleton, sugeriu ao governo dos EUA que elaborasse uma lista suja dos países da União Europeia que estivessem dispostos a proibir o plantio de sementes geneticamente modificadas por empresas norte-americanas. O teor da mensagem secreta: “A equipe parisiense sugere propor uma lista de medidas de retaliação que irá causar dores à Europa”. “Dores”, “retaliação” – a rigor, essa não é exatamente a linguagem da diplomacia.
 
A luta pela autorização do famoso milho geneticamente manipulado MON810 na Europa foi conduzida pela Monsanto com muito trabalho de lobby – e ao final, a empresa perdeu por completo. O produto foi banido inclusive dos mercados prestigiados da França e da Alemanha. Uma aliança entre políticos, agricultores e pessoas relacionadas às igrejas recusou a engenharia genética nas plantações, e os consumidores não a querem em seus pratos. No entanto, a batalha ainda não terminou. Nas negociações iniciadas nos mês passado entre os EUA e a UE, sobre um tratado de “livre” comércio, os Estados Unidos esperam, entre outras coisas, uma abertura dos mercados para a tecnologia genética.
 
Com o Tratado de Livre Comércio, EUA querem abrir o mercado de transgênicos na Europa
 
Fazer lobby por uma empresa nacional no exterior é algo visto como dever cívico, nos EUA. Há muito, as mais significativas entre os dezesseis agências de inteligência norte-americanas entendem seu trabalho como apoio aos interesses econômicos norte-americanos no cenário mundial. Alegando combater o terrorismo, não somente espionam governos, órgãos públicos e cidadãos, mas também empenham-se — do seu modo muito peculiar — a favor de interesses econômicos do país.
 
Alguns exemplos:
 
> Várias décadas atrás, quando o Japão ainda não era uma potência econômica, surgiu nos Estados Unidos a pesquisa “Japão 2000”, elaborada por um colaborador do Rochester Institute of Technology (RIT) Através de uma “política comercial temerária”, assim dizia o estudo, o Japão estaria planejando uma espécie de conquista do mundo, e os perdedores seriam os EUA. A segurança nacional dos Estados Unidos estaria ameaçada e a CIA deu o grito de guerra.
 
> Na competição global, a economia norte-americana tinha que ser protegida dos “dirty tricks”, os truques sujos dos europeus, declarou o ex diretor da CIA James Woolsey. Por esta razão, os “amigos do continente europeu” estariam sendo espionados: os Estados Unidos são limpos…
 
> Edward Snowden esteve certa vez pela CIA na Suíça, e há dias relatou a maneira como a empresa teria tentado envolver um banqueiro suíço na espionagem de dados bancários. A União Europeia permitiu aos serviços norte-americanos examinar em profundidade os negócios financeiros de seus cidadãos. Segundo dizem, o objetivo é secar as fontes financeiras do terror. Os meios e os fins, entretanto, são altamente discutíveis.
 
Na Suíça que anteriormente foi palco de muitas histórias de agentes, desenrolou-se um dos episódios que tornaram a Monsanto particularmente misteriosa: em janeiro de 2008, o ex agente da CIA Cofer Black viajou para Zurique para encontrar-se com Kevin Wilson, na época, o responsável pela segurança para questões globais. A pergunta, a respeito do que os dois homens estariam falando, ficou no ar. Certamente os assuntos eram os de sempre: opositores, negócios, inimigos mortais…
 
O jornalista investigativo Jeremy Scahill, autor da obra sobre a empresa de mercenários Blackwater, escreveu em 2010, no jornal semanal americano The Nation, sobre esse estranho encontro em Zurique. Tinha recebido documentos vazados, a respeito do assunto. Deixavam claro que a Monsanto estava querendo se defender contra ativistas que queriam destruir suas plantações experimentais; contra críticos que se posicionavam contra a empresa de modificação genética. Cofer Black era, para todos os efeitos, a pessoa certa: “Vamos tirar as luvas de pelica”, havia declarado após os ataques de 11 de setembro, conclamando seus agentes da CIA a livrar-se de Osama bin Laden no Afeganistão: “Apanhem-no: quero a cabeça dele dentro de uma caixa”. Mas ele também entende muito do outro negócio do serviço secreto; aquele que opera com fontes de acesso público.
 
Ao encontrar-se com Wilson, dirigente de segurança na Monsanto, Cofer Black ainda era vice na Blackwater, cujos clientes eram, entre outros, o Pentágono, o Departamento de Estado, a CIA, e logicamente, empresas particulares. Mas em janeiro de 2008 houve muitos tumultos, pois 17 civis foram assassinados no Iraque por mercenários da empresa de segurança, e alguns homens da Blackwater chamaram atenção de funcionários do governo iraquiano devido a atos de suborno. Acontece que Cofer Black, na época, era também o chefe da empresa de segurança Total Intelligence Solutions (TIS), uma subsidiára da Blackwater, e que, apesar de sua reputação menos devastadora, contava também com “experts” excelentes e versáteis…
 
De acordo com as próprias informações, a Monsanto fez negócio, na época, com a TIS e não com a Blackwater. Era inquestionável que a Monsanto fora abastecida pela TIS, com relatórios sobre as atividades dos críticos – as quais poderiam representar um risco para a empresa, seus colaboradores ou seus negócios operacionais. Fazia parte tanto coletar informações sobre ataques terroristas na Ásia quanto escanear páginas da internet e blogs. A Monsanto frisava que a TIS, obviamente, só tinha usado material de acesso público…
 
Isso corresponderia aos métodos de Cofer Black. Então – nada de ações escusas.
 
Costumava haver boatos frequentes de que a Monsanto quisera assumir o controle da TIS, objetivando a sua segurança geral. E hoje surgem novos rumores, segundo os quais o grupo estaria avaliando a possibilidade de assumir a empresa Academi, que formou-se após reorganizações da antiga Blackwater. Será que os rumores procedem? “Em geral, não discutimos os detalhes do nosso relacionamento com os prestadores de serviço – a não ser que essas informações já estejam disponíveis ao público”, foi a única resposta da Monsanto.
 
Toda empresa possui a sua própria história, e da história da Monsanto faz parte um assunto que queimou sua imagem não apenas junto aos hippies: no passado, a Monsanto esteve na linha de frente dos produtores do pesticida “Agente Laranja”, utilizado até janeiro de 1971 na guerra do Vietnã pelos militares norte-americanos. Os constantes bombardeios químicos desfolhavam as florestas para tornar o inimigo visível. Os campos eram envenenados para que o vietcong não tivesse mais nada para comer. Nas áreas pulverizadas multiplicou-se por dez o número de nascimentos de crianças com anomalias; nasciam sem nariz, sem olhos, com hidrocefalia ou fendas no rosto – e as forças armadas dos EUA asseguravam que o produto da Monsanto seria tão inofensivo quanto a Aspirina.
 
Será que na guerra, tudo é permitido? Principalmente na moderna guerra cibernética?
 
Chama atenção o fato de que alguém esteja dificultando, hoje, a vida dos críticos da Monsanto, ou que alguma mão invisível esteja interrompendo carreiras. Mas, quem é esse alguém? São alvos de ataque cientistas como a australiana Judy Carman, que, entre outros, tornou-se conhecida com pesquisas de produtos transgênicos. Suas publicações são questionadas por professores, os mesmos que tentam minimizar a importância dos estudos de outros críticos da Monsanto.
 
Mas o assunto não se resume a escaramuças nos círculos científicos. Pois diversas páginas da internet onde Carman publica suas pesquisas, tornam-se alvo de ataques cibernéticos e, segundo impressão de pesquisadora, são sistematicamente observadas. Exames do IP de seu site demonstram que não apenas a Monsanto acessa regularmente essas páginas, mas também diversos órgãos do governo norte-americano ligados às forças armadas. Entre outros, o Navy Network Information Center, a Federal Aviation Administration e o United States Army Intelligence Center, um órgão do exército para o treinamento de soldados em tarefas de espionagem. O interesse da Monsanto nessas pesquisas pode ser observado, também no caso de Carman. “Mas não entendo, por que o governo americano e o exército mandam me observar“, diz ela.
 
Coisas estranhas aconteceram também com a GM Watch, uma organização crítica da engenharia genética. A colaboradora Claire Robinson fala de ataques cibernéticos constantes à página desde 2007. “Toda vez em que aumentamos a segurança do site, nossos oponentes tornam-se mais tenazes e seguem novos ataques, ainda piores”, explica. Também neste caso não se acredita em coincidência. Em 2012, quando o cientista francês Eric Séralini publicou uma pesquisa bombástica sobre os riscos à saúde representados pelo milho transgênico e o glifosato, o site da GM Watch foi atacado e bloqueado. Isso se repetiu quando foi publicado o posicionamento do órgão europeu de inspeção alimentar, a EFSA. Em ambos os casos, o momento foi habilmente escolhido: no exato instante em que os editores tentavam publicar os textos. Não foi possível determinar quem estava por trás dos ataques.
 
A própria Monsanto, como já foi dito, faz questão de frisar que opera “com responsabilidade“.
 
No entanto, é fato que a empresa tem muitos interesses em jogo. Trata-se de projetos legislativos, e em especial, das negociações em curso, relacionadas ao Tratado de “livre” comércio entre EUA e UE. Os capítulos sobre Agricultura e Indústria Alimentícia são particularmente delicados. Os norte-americanos têm como meta a abertura dos mercados europeus para os produtos até então proibidos. Ao lado das plantas transgênicas, estão incluídos aditivos controversos e a carne bovina tratada com hormônios. As negociações certamente ainda vão se arrastar por alguns anos.
 
O assunto é polêmico e as negociações serão duras. Por isso, o presidente Barack Obama apontou Islam Siddiqui como chefe das negociações agrícolas. Como especialista, trabalhou durante muitos anos para o ministério de Agricultura americano. Mas, o que poucos sabem na Europa: de 2001 a 2008 ele representou, como lobista registrado, a CropLife America, uma associação industrial que representa os interesses de produtores de pesticidas e produtos transgênicos. Entre eles, é claro, a Monsanto. “A rigor, a UE não poderia aceitar tal interlocutor, devido a seus interesses, opina Manfred Häusling que representa o Partido Verde no parlamento europeu.
 
Englentich, a rigor. No médio-alto alemão, esta palavra (eigentlich) sinificava “servil”, o que não seria uma má descrição do cenário atual — onde os políticos europeus, e em especial os alemães, revelam uma atitude de surpreendente aceitação, diante do fato de serem espionados com regularidade por órgãos norte-americanos.

1. A Monsanto é o a maior empresa agrária do mundo, e também a que lidera a engenharia genética. Em 2012, o grupo ampliou seu faturamento em 14%, em comparação ao ano anterior, chegando a 13,5 bilhões de dólares. O lucro subiu 25%, atingindo dois bilhões de dólares. No mundo todo, a empresa emprega 21.500 trabalhadores e tem filiais em mais de 50 países. Sua fundação data de 1901, pelo norte-americano John Queeny em St. Louis, no estado de Missouri. O nome foi uma homenagem à família de sua esposa. Primeiro, Queeny produziu o adoçante sacarina. Em pouco tempo, o fabricante de bebidas Coca-Cola passa a fazer parte de seus clientes. Logo depois da I Guerra Mundial, a Monsanto entrou no ramo dos produtos químicos. Sua ascensão foi rápida. Em 1927, ingressou na bolsa de valores, e ampliou sua atuação no setor químico, incluindo adubos e fibras sintéticas. Investiu até mesmo na indústria petrolífera. Depois da guerra do Vietnã, a Monsanto passou a focar mais intensamente o setor agrário, o desenvolvimento de herbicidas e em seguida a produção de sementes. Nos anos oitenta, a biotecnologia foi declarada seu alvo estratégico. O próximo passo foi a modificação consequente para uma empresa agrícola – e os outros segmentos foram deixados de lado.
 

Moçambique: MENORES DESAPARECIDOS EM NAMPULA

 

Nelson Miguel – Verdade (mz)
 
Duas mães estão desesperadas e vivem dias de angústia à procura dos filhos desaparecidos, há semanas, nos bairros de Muahivire-Expansão e Natikiri, na cidade de Nampula. A aflição aumenta a cada dia que passa porque elas ainda não têm quaisquer informações sobre o paradeiro dos petizes e rezam regularmente para que nada de pior tenha acontecido.
 
Yanick Belmonte Macedo, de um ano e nove meses de vida, desapareceu da casa dos pais numa segunda-feira, 15 de Julho último, por volta das 16 horas, na zona de Mutotope (Muahivire-Expansão), naquela urbe. Na altura, ele estava sob a protecção de alguém enquanto os progenitores se encontravam no serviço.
 
Latifa Belmonte, que não vê o filho desde aquele dia, constantemente derrama lágrimas por temer que o pior aconteça ao menino, uma vez que na sociedade há indivíduos de má-fé capazes de fazer mal a uma criança inocente.
 
Na sua insistência de entrar em contacto com os supostos indivíduos que lhe podem fazer rever o filho, Latifa está sempre com o telemóvel na mão. Em cada chamada que recebe o desejo de ouvir uma voz a anunciar o paradeiro do filho, ir ao seu encontro e abraçá-lo novamente extravasa o seu coração.
 
Ao @Verdade, a progenitora assegurou que tem recebido várias mensagens e chamadas telefónicas de pessoas a alegarem que têm notícias sobre o paradeiro do seu descendente. Marcam-se encontros com vista a ter o filho de volta ao convívio familiar, mas quando retorna as ligações os números através dos quais recebe as informações estão fora de serviço.
 
Entretanto, algumas vezes, ouve, com melancolia, vozes melódicas de secretárias electrónicas, uma a dizer que “neste momento não é possível estabelecer a ligação que deseja”, sugerindo, com gentileza, que “ligue mais tarde”. Outra anuncia que “o número para onde ligou não está acessível de momento”, e com obséquio aconselha-se-lhe que “volte a tentar mais tarde”.
 
Três dias depois de Yanick ter saído da vista dos pais, a Polícia de Investigação Criminal (PIC) começou a trabalhar com vista a localizar o menor, porém, até hoje não há nenhuma novidade. Os parentes veiculam anúncios nas rádios, nas redes sociais e afixam panfletos com a imagem do petiz mas, também, estas medidas ainda não resultaram em nada.
 
Devido a essa situação, Latifa tornou-se uma mulher que vive em permanente sacrifício, priva-se de alimentos por espírito de penitência e como sinal de adoração ao seu menino que continua em parte incerta. “É difícil, mas vou horando e pedir a Deus para que, caso o meu filho esteja fechado numa casa, apareça uma bênção que abra a porta e o solte”.
 
Ainda na cidade de Nampula, Cidália Adelino, de dois anos de idade, desapareceu da casa dos pais, por volta das 17 horas, na unidade comunal Teacane (Natikiri), há dias. Na altura, os seus progenitores encontravam-se no mercado. Desde aquele dia, a mãe, Joana Ernesto, procura impacientemente pela filha. Por não ter nenhuma pista sobre o sítio onde a menina está, ela teme, igualmente, que o pior aconteça com a miúda.
 
Joana também acredita num milagre de divino mas ao mesmo tempo recorre aos curandeiros para saber em que lugar a descendente se encontra. “Fui até aos médicos tradicionais para ver se podia recuperar a minha filha”.
 
As duas progenitoras pedem a quem souber do paradeiro dos meninos para que as informem imediatamente. A Polícia também não tem notícias. Contudo, a partir do momento em que a segunda criança foi “afastada” dos pais, a corporação sentiu-se desconfortada e já relaciona os dois casos com um possível tráfico de menores dadas as circunstâncias em que os meninos desapareceram.
 
Miguel Bartolomeu, porta-voz da Polícia da República de Moçambique (PRM) em Nampula, suspeita ainda que as crianças tenham sido levadas por pessoas de má-fé que queiram aterrorizar as suas famílias. Aliás, o oficial desconfia igualmente que seja a mesma pessoa, ou grupo de indivíduos que protagonizaram a acção que deixa as duas mães com os nervos à flor da pele.
 
Refira-se que em 2003 houve vários casos que davam conta de que existia uma rede de traficantes de órgão humanos e as principais vítimas eram crianças. Nessa altura, Maria Elilda dos Santos, irmã brasileira, uma das denunciantes do referido grupo, apesar de ter mostrado algumas provas em relação à denúncia que fazia, foi expulsa do país alegadamente porque criava uma onda de desestabilização.
 
No mesmo ano, o arcebispo de Nampula, D. Tomé Makhweliha, e o Reitor do Seminário Inter-Diocesano, Pe. Carlos Alberto Gaspar Pereira, endereçaram uma carta ao Procurador-Geral da República, através da qual pediam uma investigação aturada sobre os raptos de menores. Todavia, nunca se divulgou nenhum resultado a respeito disso.
 
A nossa Reportagem ouviu alguns cidadãos sobre o desaparecimento de Yanick Macedo e Cidália Adelino, os quais disseram que este caso não constitui nenhuma surpresa para a cidade de Nampula, uma vez que, no passado, dezenas de crianças foram afastadas dos progenitores por pessoas desconhecidas, nunca mais foram encontradas e nenhuma autoridade investigou com vista a saber que fenómeno era esse.
 
Armindo Munamapa, residente no bairro de Muatala, assegurou-nos que na sua zona já “sumiram” alguns petizes. Paulo Cristóvão, natural do distrito de Nacala-Porto, garantiu-nos também que em Nacala e noutros pontos doa país acontecem coisas idênticas e muitas famílias têm entrado em desespero. Contudo, os autores desses actos dificilmente são descobertos por causa, em parte, da falta de vontade do Governo.
 
O @Verdade ouviu igualmente um sociólogo e activista da sociedade civil em Nampula, António Mutoua. Segundo ele, o desaparecimento de menores não é uma coisa nova, pois nos anos passados houve relatos de casos semelhantes.
 
O nosso entrevistado associa o problema à presença massiva de estrangeiros, maioritariamente oriundos de alguns países africanos que se encontram em conflito. “Fazem-se passar por refugiados mas, volvidos alguns anos, já são grandes empresários a movimentarem somas avultadas de dinheiro. De onde provém o capital inicial?”, perguntou Mutoua.
 
“Não quero responsabilizar os estrangeiros, mas há que se investigar, sobretudo, a forma como eles, em menos de um, dois ou três anos, conseguem enriquecer com negócios que muitas vezes não se consegue perceber”, sugeriu o sociólogo, para quem na província de Nampula pode haver tráfico de seres humanos.
 

Moçambique: ARTISTA PLÁSTICO LINCHADO POR VIGILANTES NOS ARREDORES DE MAPUTO

 

Jornal de Notícias
 
O artista plástico moçambicano Alexandria Ferreira foi assassinado, na madrugada de domingo, num linchamento popular quando fazia patrulha num bairro da Matola, onde se verificam vários assaltos.
 
Em declarações à Lusa, Nelson Ferreira, amigo de Alexandria Ferreira, disse que o escultor foi morto por populares que invadiram uma esquadra na zona do Rio Matola, onde o artista e outras três pessoas estavam albergados, para proteção policial, depois de terem sido confundidos com elementos da suposta quadrilha G-20, que está a criar pânico naquele município.
 
Alexandria Ferreira era considerado um dos melhores artistas plásticos contemporâneos em Moçambique, com prémios amealhados a nível internacional.
 
Nos últimos dias, a eventual ocorrência de casos de violações sexuais e uso de ferro quente de passar a roupa para "engomar" as vítimas, na Matola, levou a que, em alguns bairros daquele município, as populações iniciassem um patrulhamento noturno, por considerarem que a polícia não tem dado resposta adequada.
 
"Ele fazia parte de um grupo de patrulha, que foi pedir ajuda à esquadra, mas quando regressava foi interpelado por um outro grupo que os confundiu com o G-20", grupo que os populares acreditam ser protagonista dos crimes que estão a ocorrer na Matola, disse Nelson Ferreira.
 
Em declarações à Lusa, o porta-voz da Polícia da República de Moçambique (PRM) na província de Maputo, João Machava, não confirmou a morte de Alexandria Ferreira, mas afirmou que um dos elementos do quarteto - três dos quais contraíram ferimentos graves - "trazia uma peça de automóvel, que os populares confundiram com um ferro de engomar".
 
De acordo com o jornal "Notícias de Maputo", pelo menos seis pessoas morreram nos últimos dias, "por causa das patrulhas desorientadas dos residentes da periferia de Matola e Boane", na província de Maputo.
 
Na sexta-feira, o ministro moçambicano do Interior, Alberto Mondlane, disse que "o grupo G20 não existe" e que "indivíduos de má-fé inventaram" a existência de um gangue organizado, até porque, assinalou, a polícia registou somente um caso de uma vítima atacada por elementos que usaram ferro quente de passar a roupa no seu corpo no bairro São Dâmaso, na Matola.
 
Alberto Mondlane considerou o referido caso registado no São Dâmaso como uma "situação isolada", rejeitando a existência de outras situações semelhantes.
 

Portugal - Teixeira da Mota: "É importante chamar palhaço a quem acho que é palhaço"

 

Notícias ao Minuto
 
Francisco Teixeira da Mota foi o advogado responsável pela defesa do escritor e jornalista Miguel Sousa Tavares no âmbito da queixa-crime apresentada pelo Presidente da República, Cavaco Silva, e, a esse propósito, comenta em entrevista ao i: “É importante chamar palhaço a quem acho que é palhaço”. Teixeira da Mota considera também que em Portugal não se aceita a crítica porque “temos todos o rei na barriga”.
 
Em entrevista ao jornal i, publicada esta segunda-feira, o advogado Francisco Teixeira da Mota, responsável pela defesa do escritor e jornalista Miguel Sousa Tavares no caso da queixa-crime apresentada pelo Presidente da República na sequência da expressão “palhaço”, refere que nos tribunais “ainda há uma cultura do respeitinho” proveniente dos 48 anos de ditadura em que vivemos e que habituou os portugueses a uma “lógica de respeito excessivo pela autoridade”.
 
Mas a juntar a isto, em Portugal, não se aceita a crítica porque temos todos o rei na barriga” e porque “há uma tendência para não dizer, porque se não digo mal de ti também não dizes mal de mim. Isto é”, concluiu, “uma aldeia, aliás, hoje em dia é mais um condomínio que uma aldeia”.
 
É, portanto, “importante discutir, estar em causa, chamar palhaço a quem acho que é palhaço, poder dizer que é energúmeno quem o é, dizer que alguém não vale nada, que não tem nenhum valor politicamente”, afirma o advogado.
 
Talvez por isso, Francisco Teixeira da Mota tenha sido o primeiro advogado a conseguir uma condenação do Estado português junto do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem por violação da liberdade de expressão e um dos profissionais que, desde o início da sua carreira, se dedicou e especializou na defesa de jornalistas.
 

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