segunda-feira, 1 de abril de 2013

Brasil: O EDITORIAL DE ROBERTO MARINHO QUE EXALTOU A DITADURA MILITAR




Nestes dias em que o golpe militar de 1964 completa 49 anos, ‘Carta Maior’ traz a seus leitores o editorial escrito por Roberto Marinho no jornal ‘O Globo’, em 1984, em que exalta conquistas políticas e econômicas supostamente obtidas pela ditadura, assim como a própria participação de seu grupo empresarial no golpe.

Carta Maior

Em 7 de outubro de 1984, às vésperas do fim da ditadura militar e da retomada do governo federal pelos civis, o presidente das Organizações Globo, Roberto Marinho, publicava um editorial no jornal ‘O Globo’ em que exaltava conquistas políticas e econômicas supostamente obtidas pela ditadura, assim como a própria participação de seu grupo empresarial no golpe de 1964. Veja a seguir a íntegra do texto assinado por Roberto Marinho.

”Julgamento da Revolução

Roberto Marinho

Participamos da Revolução de 1964, identificados com os anseios nacionais de preservação das lnstituições democráticas, ameaçadas pela radicalização ideológica, greves, desordem social e corrupção generalizada. Quando a nossa redação foi invadida por tropas anti-revolucionárias, mantivemo-nos firmes e nossa posição.Prosseguimos apoiando o movimento vitorioso desde os primeiros momentos de correção de rumos até o atual processo de abertura, que se deverá consolidar com a posse do novo presidente. 

Temos permanecidos fiéis aos seus objetivos, embora conflitando em várias oportunidades com aqueles que pretenderam assumir o controle do processo revolucionário, esquecendo-se de que os acontecimentos se iniciaram, como reconheceu o Marechal Costa e Silva, "por exigência inelutável do povo brasileiro". Sem o povo não haveria revolução, mas apenas um 'pronunciamento" ou "golpe" com o qual não estaríamos solidários. 

O Globo, desde a Aliança Liberal, quando lutou contra os vícios políticos da Primeira República, vem pugnando por uma autêntica democracia, e progresso econômico e social do País. Em 1964, teria de unir-se aos companheiros jornalistas de jornadas anteriores, aos 'tenentes e bacharéis' que se mantinham coerentes com as tradições e os ideais de 1930, aos expedicionários da FEB que ocupavam a Chefia das Forças Armadas, aos quais sob a pressão de grandes marchas populares, mudando o curso de nossa história. 

Acompanhamos esse esforço de renovação em todas as suas fases. No período de ordenação de nossa economia, que se encerrou em 1977. Nos meses dramáticos de 1968 em que a intensificação dos atos de terrorismo provocou a implantação do AI-5. Na expansão econômica de 1969 a 1972, quando o produto nacional bruto cresceu à taxa média anual de 10 %. Assinale-se que, naquele primeiro decênio revolucionário, a inflação decrescera de 96 % para 12,6 % ao ano, elevando-se as exportações anuais de 1 bilhão e 300 mil dólares para mais de 12 bilhões de dólares. Na era do impacto da crise mundial do petróleo desencadeada em 1973 e repetida em 1979, a que se seguiram aumentos vertiginosos nas taxas de juros, impondo-nos , uma sucessão de sacrifícios para superar a nossa dependência externa de energia, a deterioração dos preços dos nossos produtos de exportação e a desorganização do sistema financeiro internacional. Essa conjunção de fatores que violaram a administração de nossas contas externas obrigou- nos a desvalorizações cambiais de emergência que teriam fatalmente de resultar na exacerbação do processo inflacionário. Nas respostas que a sociedade e o governo brasileiros deram a esses desafios, conseguindo no segundo decênio revolucionário que agora se completa, apesar das dificuldades, reduzir de 80 % para menos de 40% a dependência ex- terna na importação de energia, elevando a produção de petróleo de 175 mil para 500 mil barris diários e a de álcool, de 680 milhões para 8 bilhões de litros; e simultaneamente aumentar a fabricação industrial em 85%, expandir a área plantada para produção de alimentos com 20 milhões de hectares a mais, criar 13 milhões de novos empregos, assegurar a presença de mais de 10 milhões de estudantes nos bancos escolares, ampliar a população economicamente ativa de 29 milhões para 45 milhões, 797 mil, elevando as exportações anuais de 12 bilhões para 22 bilhões de dólares. 

Volvendo os olhos para as realizações nacionais dos últimos vinte anos, há que se reconhecer um avanço impressionante: em 1964, éramos a quadragésima nona economia mundial, com uma população de 80 milhões de pessoas e uma renda per capita de 900 dólares; somos hoje a oitava, com uma população de 130 milhões de pessoas, e uma renda média per capita de 2.500 dólares. 

O Presidente Castello Branco, em seu discurso e posse, anunciou que a Revolução visava? à arrancada para o desenvolvimento econômico, pela elevação moral e política". Dessa maneira, acima do progresso material, delineava-se o objetivo supremo da preservação dos princípios éticos e do restabelecimento do estado de direito. Em 24 de junho de 1978, o Presidente Geisel anunciou o fim dos atos de exceção, abrangendo o AI-5, o Decreto-Lei 477 e demais Atos Institucionais. Com isso, restauravam-se as garantias da magistratura e o instituto do habeas-corpus. Cessava a competência do Presidente para decretar o fechamento do Congresso e a intervenção nos Estados, fora das determinações constitucionais. Perdia o Executivo as atribuições de suspender os direitos políticos, cassar mandatos, demitir funcionários e reformar militares. Extinguiam-se as atividades da C.G.1 (Comissão Geral de Inquéritos) e o confisco sumário de bens. Desapareciam da legislação o banimento, a pena de morte, a prisão perpétua e a inelegibilidade perene dos cassados. Findava-se o período discricionário, significando que os anseios de liberalização que Castello Branco e Costa e Silva manifestaram em diversas ocasiões e que Médici vislumbrou em seu primeiro pronunciamento finalmente se concretizavam. 

Enquanto vários líderes oposicionistas pretenderam considerar aquelas medidas fundamentais como 'meros paliativos", o então Deputado Tancredo Neves, líder do MDB na Câmara Federal, reconheceu que a determinação governamental ?foi além do esperado". 

Ao assumir o Governo, o Presidente Flgueiredo jurou dar continuidade ao processo de redemocratização. A concessão da anistia ampla e irrestrita, as eleições diretas para Governadores dos Estados, a colaboração federal com os novos Governos oposicionistas na defesa dos interesses maiores da coletividade, são demonstrações de que o presidente não falou em vão. 

Não há memória de que haja ocorrido aqui, ou em qualquer outro país, que um regime de força, consolidado há mais de dez anos, se tenha utilizado do seu próprio arbítrio para se auto-limitar, extinguindo os poderes de exceção, anistiando adversários, ensejando novos quadros partidários, em plena liberdade de imprensa. É esse, indubitavelmente, o maior feito da Revolução de 1964 

Neste momento em que se desenvolve o processo da sucessão presidencial, exige-se coerência de todos os que têm a missão de preservar as conquistas econômicas e políticas dos últimos decênios. 

O caminho para o aperfeiçoamento das instituições é reto. Não admite desvios aéticos, nem afastamento do povo. 

Adotar outros rumos ou retroceder para atender a meras conveniências de facções ou assegurar a manutenção de privilégios seria trair a Revolução no seu ato final".

Brasil: Arquivo de São Paulo divulga documentos da ditadura militar na internet




Deutsche Welle

Ao contrário de outros países sul-americanos, até hoje o Brasil não se ocupou devidamente dos crimes do regime 1964-1985. Para vítimas, medidas não vão longe o suficiente. Disponibilização na rede abre caminhos.

O Brasil dá mais um passo na recuperação de sua memória política, em especial na investigação do período ditatorial mais recente. Nesta segunda-feira (01/04), entrou online o site do Arquivo Público do Estado de São Paulo, permitindo, pela primeira vez, acessar cerca de 1 milhão de documentos relativos à ditadura militar de 1964-1985.

Os arquivos revelam quem foi perseguido e espionado pelo regime. Já os nomes dos responsáveis, no entanto, foram omitidos. Os documentos são originários do Departamento Estadual de Ordem Política e Social (Deops), órgão importante no aparato repressivo dos militares, e foram guardados pela Polícia Federal, antes de serem confiados ao estado de São Paulo, em 1990.

Divulgar, para que não se repita

No site do arquivo, Lauro Ávila Pereira, diretor do Departamento de Preservação e Difusão do Acervo, avalia que a iniciativa pode ajudar a identificação daqueles agentes públicos que, durante a época da ditadura, cometeram violações dos Direitos Humanos. "Temos que lembrar que o Brasil é um dos poucos países da América do Sul onde esse tipo de crime jamais foi punido." Pereira ressalta, ainda, a importância didática do acervo online, que pode ser utilizado pelos professores em sala de aula.

A disponibilização resulta da parceria entre a Associação dos Amigos do Arquivo Público de São Paulo e o projeto Marcas da Memória da Comissão de Anistia, do Ministério da Justiça, com o apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp).

A parcela agora acessível, em torno de 1 milhão de fichas, prontuários e dossiês, compõe cerca de 10% do acervo total. Sua seleção e digitalização exigiram mais de três anos, e o processo de digitalização prossegue até 2014.

Um projeto análogo, e já em pleno funcionamento, é o website Documentos Revelados, que contém milhares de testemunhos históricos relativos ao último período ditatorial brasileiro.

Disponibilizados em formatos PDF e JPEG, os arquivos contemplam desde relatórios policiais, depoimentos, análises periciais e processos judiciais, até cartas e fotografias – além de jornais e panfletos produzidos por organizações que resistiram ao regime militar. O editor do site, Aluízio Palmar, que se apresenta como "um sobrevivente", baseou-se sobretudo em arquivos estaduais.

Hora da verdade – finalmente?

Ao contrário de outros países sul-americanos, como o Chile ou a Argentina, até hoje o Brasil não elaborou devidamente os crimes da ditadura dos pontos de vista jurídico e legislativo.

Somente em novembro de 2011 a presidente Dilma Rousseff instituiu uma Comissão da Verdade, com o objetivo de apurar violações dos direitos humanos ocorridos entre 1946 e 1988. Na ocasião, ela sancionou também a Lei de Acesso a Informações Públicas, acabando com o sigilo eterno de documentos.

Segundo dados oficiais, 480 pessoas foram assassinadas por motivos políticos durante a ditadura no Brasil. Mais de 100 mil foram presas, e o número das vítimas de tortura é calculado em 50 mil, no mínimo. O destino de 160 desaparecidos segue não esclarecido.

Para muitas das vítimas, a elaboração do período militar precisa ir mais longe. Elas exigem a revogação da Lei de Anistia de 1979, que garante impunidade aos que atuaram como torturadores entre 1964 e 1985.

SEUL PROMETE RESPONDER “COM FORÇA” A PROVOCAÇÕES DA COREIA DO NORTE





Presidente sul-coreana ordenou a Exército do país que responda com rapidez e determinação, sem considerações de ordem política. EUA enviam mais caças à região e suspeitam que norte-coreanos tenham bomba de urânio.

A presidente da Coreia do Sul, Park Guen-hye, disse nesta segunda-feira (01/04) que qualquer provocação dos norte-coreanos vai desencadear uma retaliação imediata de Seul. As duras palavras vêm em resposta às recentes ameaças de Pyongyang e a declaração de que estaria em "estado de guerra" com o país vizinho.

De acordo com a agência de notícias Yonhap, Park ordenou ao Exército sul-coreano que responda com rapidez e determinação às provocações "sem nenhuma consideração de ordem política" e, assim, marca um novo acirramento da já elevada tensão militar entre os dois países.

Park assegurou que "leva a sério" as últimas ameaças do país vizinho. "Vou confiar no juízo militar perante as repentinas e surpreendentes provocações da Coreia do Norte [...]. Por favor, cumpram com seu dever de salvaguardar a segurança do povo, sem se distrair nem por um instante", disse a presidente em conferência no Ministério da Defesa em Seul.

EUA envia jatos para a região

Nesse processo de escalada – pelo menos até agora só retórica –, os Estados Unidos enviaram caças de combate F-22 à península coreana com o objetivo de realizar novas manobras conjuntas com os sul-coreanos, informou a edição online doWall Street Journal. Cerca de 10 mil militares sul-coreanos e 3.500 norte-americanos realizam os exercícios militares conjuntos.

O jornal qualificou ainda a medida como outro passo de Washington para demonstrar sua capacidade militar aos norte-coreanos. Na semana passada, o país havia enviado para os exercícios militares dois bombardeiros B-52, com capacidade de transportar ogivas nucleares.

Pyongyang invalidou unilateralmente o tratado de não agressão entre os dois países – que em 1953 colocou fim à Guerra da Coreia – e cortou a linha de comunicação direta com o Sul. Neste sábado, o país também se declarou em "estado de guerra" com o Sul, em resposta ao que denominou "exercícios militares hostis" da Coreia do Sul e Estados Unidos.

Preocupação com cooperação iraniana

O jornal norte-americano Washington Postdivulgou nesta segunda-feira que autoridades norte-americanas e especialistas independentes desconfiam que a Coreia do Norte tenha "dado passos incomuns" para ocultar detalhes dos testes nucleares realizados no dia 12 de fevereiro.

Há a suspeita que o país tenha utilizado uma bomba de urânio altamente enriquecido. De acordo com análises recolhidas em 12 de fevereiro, os efeitos da explosão foram "notavelmente bem contidos" e poucos traços radioativos detectáveis foram lançados na atmosfera.

As autoridades norte-americanas se anteciparam ao teste e o monitoraram "de perto" para descobrir pistas que possam levar à composição da bomba, a terceira detonada pela Coreia do Norte desde 2006.

Um teste bem-sucedido com uma bomba de urânio confirmaria que Pyongyang obteve uma "segunda via" para construção de armas nucleares, usando sua abundante oferta de urânio natural e sua nova tecnologia de enriquecimento – aumentando as preocupações de um aprofundamento da cooperação entre o regime norte-coreano e o Irã.

FC/ap/afp/dpa/rtr

A COREIA DO NORTE FUMA MACONHA TODO O DIA




Choque cultural: num dos países que mais restringem direitos civis e políticos, a erva é fumada livremente — e apreciada em especial pelos soldados…

Ben Young, na ViceOutras Palavras -  Ilustrações: Emily Bakes

Há anos, o correspondente/freela de longa-data Alex Hoban vem desvendando a Coreia do Norte pra gente, mas aconteceu que ele tinha tanto para dizer sobre o assunto que decidiu abrir um site de notícias destinado ao país. NK NEWS é o resultado disso, e desde o seu lançamento no último mês de setembro, ótimas histórias têm saído diariamente – como esta que trazemos aqui, do Ben Young. Então vai conferir o site, siga os caras no Twitter e, se você estiver afim de grandes desafios, eles também têm esse misterioso formulário de cadastro que dá a chance de se unir a eles na próxima grande aventura no reino eremita.

Coreia do Norte, o país mais amordaçado, conservador e controlador do mundo também é um paraíso para os maconheiros. Apesar da postura séria do governo sobre uso e distribuição de drogas pesadas, como cristal de metanfetamina (que tem um legado notório no país), a maconha não é considerada droga. Como resultado, a escolha perspicaz bolada no papel de seda de arroz dos norte-coreanos sugere que, no mínimo para a maconheirada, a Coreia pode ser, enfim, o paraíso.

A NK NEWS recebe relatos frequentes de visitantes retornando da Coreia do Norte, dizendo que há plantas de maconha crescendo livremente ao longo das estradas, da cidade portuária de Chongjin, ao norte, até as ruas da capital Pyongyang, no sudoeste, onde é possível dar uma bola livremente pelas ruas e a doce marofa pega as suas narinas de surpresa. Nossas fontes são pessoas que nós sabemos que trabalham dentro da Coreia e fazem viagens para o país periodicamente.

Não existe tabu acerca da erva e seus apreciadores por lá – muitos residentes a conhecem e já a experimentaram. Na Coreia do Norte, a droga atende pelo nome de ip tambae, ou “folha de tabaco”, comumente relatada por ser especialmente popular entre os jovens soldados do exército norte-coreano. Ao invés de ficarem viciados em alcatrão e nicotina como os milicos do Ocidente, eles conseguem relaxar acendendo um baseado king-size durante a folga na ronda.

Apesar do fato de o governo não pegar no pé do uso da maconha (ou do ópio) e do seu predomínio entre as pessoas comuns, os mochileiros-maconheiros ansiosos por uma amostra do broto da erva vão se decepcionar. Se um turista ocidental perguntar para o seu guia qual o melhor lugar para se conseguir a “planta especial”, como é eufemisticamente chamada, o guia provavelmente evitará responder. A maioria deles é educada o suficiente quanto às legislações ocidentais a respeito da substância, e não sente a necessidade de promover algo que pode atrair propaganda negativa. Mas apareça com uma garrafa de conhaque e eles poderão ficar subitamente mais dispostos a lhe ajudar.

As razões para se fumar maconha na Coreia do Norte diferem para o continente americano. Na Coreia, você não acende “unzinho” simplesmente para ficar chapado e rir até suas tripas saírem pra fora, você fuma para economizar e dar um tempo dos cigarros baratos locais. No mercado negro, maconha costuma ser vendida por um preço baixo e é fácil de se conseguir. Portanto, a droga é muito popular entre as pessoas das classes mais baixas da sociedade norte-coreana. Depois de um longo dia de trabalho duro manual, é normal para os trabalhadores locais dar um tapa para relaxar e acalmar os músculos.

Um dos grandes ensinamentos do senso comum norte-coreano e que nós já ouvimos milhares de vezes diz sobre os cidadãos não poderem dobrar seus jornais, para que não dobrem acidentalmente a foto de seus líderes. Mas, felizmente, não é toda página de jornal que traz esses homens poderosos em busca de atenção, então todas as partes do jornal mais fáceis de reciclar (esportes, previsão do tempo, programação da TV) acabam sendo usadas para enrolar tabaco e maconha.

O jornal Rodong Sinmun é a seda preferida entre os fumantes de lá. Ele é cortado em quadrados e então enrolado em forma de pequenos cones. Uma fonte confirmou à NK NEWS  que já encontrou uma ponta semifumada no chão de uma área rural do país, enrolada num Rodong Sinmun. A mesma fonte também notou, tragicamente, que a erva na Coreia Norte não é lá muito forte.

Embora cresça naturalmente pela península coreana, ela é cultivada mais formalmente em determinadas áreas. A maconha costuma ser cultivada em jardins particulares da Coreia do Norte. Um americano que viaja anualmente para lá comentou no Reddit: “Nós fomos a um jardim um dia, demos uma boa olhada e dissemos ‘hei, isso é maconha!’. Nós olhamos de perto e nos certificamos de que era cannabis. Eu ouvi que era usada para fins medicinais, e encontrá-la foi interessante”.

Relatos da erva na região vêm desde a formação do país. Após a Guerra da Coreia (1950-1953), soldados estadunidenses começaram a arrancá-la de áreas próximas da fronteira das Coreias e fumar. Histórias de tendas virarem saunas enfumaçadas por combatentes cansados são uma lembrança comum do folclore daqueles tempos difíceis.

De volta ao Ocidente, com a recente legalização nos estados de Washington e Colorado, alguns americanos estão clamando pela legalização em todo o país. Enquanto isso, permanece uma questão controversa o fato de a erva parecer costumeiramente usada na Coreia do Norte como uma fuga barata de uma sociedade rigidamente controlada, sugerindo que, para todas as outras preocupações que eles têm de aturar, pelo menos os norte-coreanos desfrutam de um privilégio negado às pessoas, como eu, que vivem aqui na terra dos livres.

Angola: MANIFESTAÇÃO SILENCIADA, PORQUÊ?




Eugénio Costa Almeida* – Pululu - 30.03.13

Estava prevista para hoje, em Luanda, uma manifestação levada a efeito por jovens e por angolanos que desejavam saber onde param dois activistas desaparecidos há muitos meses, sem que as autoridades consigam deslindar esta situação.

Registe-se que, também, e dentro desta linha, uma jornalista Bissau-guineense, Milocas Pereira, no que já levou Bissau a pedir esclarecimentos às nossas autoridades, está desaparecida há muitos meses sem que se consiga saber por onde anda e sem que as autoridades tenham obtido comprovação da sua saída para o exterior.

Ora a manifestação estava marcada para hoje. Mas, mais uma vez, e fazendo arrepio do art.º 47º (Liberdade de reunião e de manifestação), nos seus parágrafos 1 e 2, que se transcrevem,

.....1. É garantida a todos os cidadãos a liberdade de reunião e de manifestação pacífica e sem armas, sem necessidade de qualquer autorização e nos termos da lei.

.....2. As reuniões e manifestações em lugares públicos carecem de prévia comunicação à autoridade competente, nos termos e para os efeitos estabelecidos por lei.

A manifestação foi reprimida pelas autoridades policiais.

a manifestação foi impedida de se realizar, havendo, segundo algumas fontes, detidos.

Desconheço quais as razões para que a polícia tenha, como denunciam, intervindo e porque, parece, tenha, também, detido alguns dos mais mediáticos manifestantes.

É altura, de uma vez, o Procurador-geral da República PGR) e o Provedor de Justiça fazerem compreender as autoridades, em geral, e as policiais, em particular, que a Constituição jurada pelo Presidente e pelos mais altos dignitários nacionais tem de ser cumprida e deve ser levada a sério.

Está em causa, mais que hipotéticas situações de colocar a integridade territorial e a soberania nacional, como alguns, por vezes, fazem eco para justificar certas intervenções autoritárias, há que cumprir o nº 2 do art.º 56º (Garantia geral do Estado):

.....Todas as autoridades públicas têm o dever de respeitar e de garantir o livre exercício dos direitos e das liberdades fundamentais e o cumprimento dos deveres constitucionais e legais.

Vamos aguardar que o PGR ou o Provedor nos esclareçam o que realmente se passou e porque aconteceu.

Não esqueçamos as recentes apreciações das Nações Unidas quanto a eventuais menos correctas atitudes policiais. Está em causa o bom nome do País!

*Página de um lusofónico angolano-português, licenciado e mestre em Relações Internacionais e Doutorado em Ciências Sociais - ramo Relações Internacionais -; nele poderão aceder a ensaios académicos e artigos de opinião, relacionados com a actividade académica, social e associativa.

ANGOLA AMORDAÇADA




Guilherme Dias – Lusomonitor, opinião

“Aprofundar a democracia participativa”. Foi esta a última promessa de campanha de José Eduardo dos Santos, a 29 de Agosto de 2012, num comício junto ao estádio 11 de Novembro, nos arredores de Luanda. Aprofundar, disse, “através da concertação do Governo com os parceiros sociais, sociedade civil e autoridades tradicionais, de modo a que todos participem organizadamente na resolução dos problemas da nação”.

Poucos, muito poucos mesmo, terão acreditado. Mas era difícil acreditar que durasse tão pouco: menos de um ano depois, o regime voltou a usar da força para silenciar as vozes de protesto. Quase duas dezenas de manifestantes foram detidos, jornalistas impedidos de trabalhar, ativistas dos Direitos Humanos ameaçados. Silenciamento total da comunicação social pública, quase total da parte da privada. No sábado, Angola foi, mais uma vez, amordaçada.

Viu-se mais uma vez o pior do regime angolano. O uso de força desmesurada para conter algumas dezenas de jovens, armados apenas com a frustração e o cântico de protesto. Mas viu-se também o medo de uma elite que sabe que os que desceram até ao cemitério de Santa Ana, defronte do Comando Provincial da Polícia Nacional, são apenas uma pequena amostra dos que querem uma mudança – uma “primavera”, como lhe chamam os organizadores da manifestação de sábado.

E agora…

Quantos mais, ao ler as notícias sobre o silenciamento da manifestação, terão eles próprios sido tomados desse desejo de mudança?

Qual seria o efeito de a liderança angolana levar a sério as suas palavras – “aprofundar a democracia participativa”, lembre-se – e iniciar um processo inclusivo de reformas, envolvendo toda a sociedade civil, desde os intelectuais e inclusivamente históricos do MPLA que há anos reivindicam uma abertura, às ONG e aos mais contestatários?

E como pode um dos mais ricos e poderosos regimes de África ter medo de um punhado de jovens ao ponto de danificar ainda mais a sua pobre reputação de cumprimento dos preceitos da democracia e Direitos Humanos?

A comunidade internacional vai imitar a comunicação social pública angolana e fingir que nada aconteceu no cemitério de Santa Ana no dia 30 de Março de 2013?

Antes da manifestação marcada pela Primavera Angolana, Luís Rocha, um dos organizadores, dizia ao LusoMonitor estar preparado para esperar, por estas e outras respostas. “Continuamos pacientemente a moralizar o angolano a demolir essa muralha do medo e reivindicar os seus direitos fundamentais”.

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Portugal: A SEMANA DO TC, DO PS E DO GOVERNO




Nicolau Santos – Expresso, opinião

No dia 2 de janeiro de 2013 o Presidente da República pediu ao Tribunal Constitucional (TC) a fiscalização sucessiva da constitucionalidade do Orçamento do Estado para 2013. Em causa estão artigos relacionados com cortes nas pensões e nos subsídios de férias.

Noventa dias depois, o TC ainda não conseguiu divulgar a sua doutissima opinião sobre estes temas que, por acaso, são muitíssimo importantes para o futuro do país.

E são porque, de repente, o Governo concluiu que não tem nenhum plano B para um eventual chumbo do TC a algumas das matérias em questão, pelo que pressiona publicamente os juízes e, por interpostos spin doctors, admite mesmo demitir-se se o OE for de alguma forma afetado pela decisão do TC.

Pelo meio, o PS apresentou uma moção de censura que será discutida e votada esta semana, embora o secretário-geral dos socialistas tenha tido o cuidado de enviar uma carta a todos as partes que integram a troika para os descansar: a moção é uma coisa em forma de assim e não tem que temer nada da dita.

Digamos, pois, que o Tribunal Constitucional, o Governo e o PS de António José Seguro estão todos bem uns para os outros e infelizmente nenhum deles está à altura do que o país nesta altura precisa.

E já agora não, não é verdade que cada país tem o Governo, a oposição e o TC que merece. Não, não e não. Os portugueses merecem bem melhor do que isto.  

Portugal - Bacelar Gouveia: O GOVERNO FEZ PRESSÕES DISSIMULADAS SOBRE O TC




TSF

O constitucionalista Jorge Bacelar Gouveia concluiu, no Fórum da TSF, que o Executivo revelou total «amadorismo» em relação ao Tribunal Constitucional. Já Jorge Miranda pede respeito pelo TC.

À espera da decisão do Tribunal Constitucional, e com o primeiro- ministro a lembrar aos juízes que também eles devem ter responsabilidade nas decisões, Jorge Bacelar Gouveia conclui que o Governo, de maneira dissumulada, fez pressão sobre o TC.

No Fórum da TSF, este professor de Direito Constitucional revelou que se trata de algo inadmissível e que pode ser perverso.

«O Governo revelou um total amadorismo na condução deste processo não obstante o direito que tem de achar que as normas são inconstitucionais», afirmou.

Bacelar Gouveia disse ainda que o TC deve ter em conta o contexto económico-financeiro, equilibrando esse fator com o respeito que se exige pela Constituição, mas alertou que não podem ser usados argumentos como a crise política ou o país a cair na bancarrota.

Por seu turno, o constitucionalista Jorge Miranda apelou à autocontenção do Governo e da oposição e pede respeito pelo Tribunal Constitucional .

Ouvido igualmente no Fórum da TSF, o politólogo Carlos Jalali considerou que estamos a viver o PEC IV de Pedro Passos Coelho.


Portugal: ÚLTIMA HORA, O GOVERNO PEDIU A DEMISSÃO





O Governo do Passos Coelho demitiu-se e já vão todos partiram na sua estrada dourada em busca dos seus sonhos. Nem vou tentar mentir, é dia 1 de Abril e o governo continua em São Bento e o Sr. Silva em Belém. 

Mas seria sem dúvida uma boa notícia ver o Cavaco em busca de Coragem, para pelo menos cumprir com os seus deveres constitucionais, o Vitor Gaspar de um coração para ter um pouco mais de respeito e consideração pelos que sofrem com as suas brutais medidas de austeridade, o Álvaro de um cérebro para ver se ainda se salva algo da nossa economia e o Passos Coelho de encontrar o caminho de volta muito para lá de onde veio.

Espanha: NÃO TOQUEM NA MINHA CASA!




LIBÉRATION, PARIS – Presseurop

Criticar publicamente os políticos que se recusam a rever a lei sobre as hipotecas: o “escrache”, vindo da Argentina dos militares, é a nova estratégia dos grupos que lutam contra os despejos. Reportagem.


Naquela manhã, no maior segredo, encontram-se na estação de Atocha, em Madrid, à espera das suas “presas”. No local a que muitos deputados chegam, vindos das suas circunscrições, para uma sessão plenária no parlamento. Por volta das sete e meia, equipados com apitos e altifalantes, dezenas de manifestantes concentram-se na área de chegadas do TGV. Cada um deles traz dois cartões, um verde que proclama “Sim, somos capazes” (de parar os despejos imobiliários), e um vermelho que lamenta: “Mas eles não querem” (os políticos).

Por volta das nove horas, os comboios multiplicam-se, provenientes de Valência, Barcelona ou Sevilha. A tensão sobe. “Anulação das dívidas e habitação social para os expulsos”, gritam os militantes. Acabados de chegar, os agentes da polícia improvisam um cordão de segurança e quando um deputado aparece ao longe, alguns agentes correm a protegê-lo e a facilitar-lhe o caminho até à praça de táxis.

Após quatro anos de luta para pôr fim ao drama dos despejos imobiliários – 510 por dia desde o início de 2013 –, a centena de grupos antidespejos (espalhados por todo o país) acaba de pôr em prática uma nova estratégia: oescrache (“revelação”). Esta palavra argentina designa as manifestações de cidadãos que, nos anos de 1990, tinham como objetivo denunciar publicamente – geralmente tinha lugar em frente à casa ou ao local de trabalho – os responsáveis pela repressão militar de 1976 a 1983.

Manter a pressão popular

Nesta Espanha revoltada com o facto de estar a ser posta na rua gente que perdeu o seu emprego (26% da população ativa está desempregada) e que, por isso, deixou de poder pagar os seus empréstimos, o método do escracheveio mesmo a calhar para fustigar os políticos que não estão dispostos a alterar profundamente a legislação em vigor sobre hipotecas. “Ainda estamos em rodagem”, confidencia Guillem, coordenador da ação em Atocha. “Mas vamos aperfeiçoar-nos para cobrirmos de opróbrio os deputados recalcitrantes, indo a casa deles, surpreendendo-os nos restaurantes, nos hotéis. Não os vamos largar.”

Desde meados de março, os Indignados também ocuparam o hotel Ritz, em Madrid, e organizaram um barulhento acampamento em frente ao apartamento de Barcelona de um deputado conservador. “A nossa estratégia é absurdamente pacífica; não se trata de agredir ou de insultar, mas de manter a pressão popular. Se a nossa voz, apoiada pela grande maioria dos espanhóis, não for ouvida, então, isso quer dizer que não há democracia”, declara Ada Colau, a inspiradora dos grupos antidespejos que recolheram 1,4 milhões de assinaturas em três anos. A 12 de fevereiro, o abaixo-assinado permitiu apresentar na Câmara de Deputados uma iniciativa legislativa popular (ILP) com três pontos: moratória sobre os despejos, anulação retroativa dos atrasos após a perda da casa e criação de um parque de habitação social. O objetivo dos escraches é, precisamente, pressionar os deputados do Partido Popular (PP, conservadores), no Governo com maioria absoluta, e os únicos a oporem-se à ILP.

Concerto de panelas e de palavras de ordem

Desde a semana passada, está em marcha a dinâmica do opróbrio. De surpresa, dezenas de militantes antidespejos seguiram o rasto de vários deputados conservadores, especialmente os altos dirigentes do PP: em frente ao parlamento, por baixo dos seus escritórios e, cada vez mais, à porta das suas casas. Cada vez que um político é vaiado, há um concerto de panelas e de palavras de ordem entoadas através de altifalantes. “Na rua, o povo lembra-lhe o seu dever democrático”, diz Ivan, um dos coordenadores. Mas os políticos visados veem nisto um método inaceitável.

“Esta perseguição contra os políticos é antidemocrática” declarou, na segunda-feira, 25 de março, o primeiro-ministro Mariano Rajoy. O chefe do Governo, que ainda não marcou a data para a votação da ILP, está voltado para a parede. Apesar da pressão popular, recusar atender as súplicas. “Isso faria cair, ainda mais, os créditos hipotecários. Dada a nossa fragilidade financeira, é demasiado arriscado”, justifica o executivo.

Luta dos antidespejos vai continuar

No entanto, as nuvens acumulam-se sobre a cabeça dos Populares: uma sondagem do Instituto Metroscopia revelou, em fevereiro, que 85% dos espanhóis, comovidos com as famílias que vivem acampadas nas ruas, apoiam o combate antidespejos. Os partidos da oposição formam uma frente unida e os juízes alegam objeção de consciência. Desde dezembro, suicidaram-se seis pessoas que estavam prestes a ser postas na rua por oficiais de justiça.

Por outro lado, a 14 de março, o Tribunal Europeu de Justiça deu razão a um queixoso espanhol, alegando que a legislação nacional era “injusta”. Em vigor desde 1909, a lei permite despejos muito rápidos (logo desde o primeiro aviso de incumprimento), impede o proprietário de se defender dos termos – muitas vezes abusivos – do contrato assinado com o banco, e obriga a pessoa despejada a pagar as prestações em atraso com juros proibitivos. “Esta sentença do Tribunal Europeu abre novas perspetivas”, diz o juiz Fernandez Seijo, que esteve na origem da queixa. “Vamos poder bloquear mais facilmente os despejos.”

Pressionado, o Governo de Rajoy anunciou que a nova lei “terá em conta algumas objeções” do Tribunal Europeu. Mas, precisou, “em caso algum será possível a anulação das prestações em atraso”. A luta dos grupos antidespejos, para quem este ponto não é negociável, vai continuar. E osescraches também.

RETRATO

O indignado silencioso

A 14 de março, o Tribunal Europeu de Justiça decidiu que “a legislação espanhola é contrária ao direito da União”. Na sentença, explica que a lei “impede o juiz competente de declarar o caráter abusivo de uma cláusula de um empréstimo imobiliário e de suspender o processo de execução hipotecária”.

Para o jornal El Pais, trata-se de uma grande vitória de Dionisio Moreno, o advogado que recorreu ao tribunal. O diário conta como Moreno tratou do caso de Mohamed Aziz, despejado de sua casa em janeiro de 2011.

O advogado queixou-se aos tribunais que a lei nacional é “injusta”. Nessa batalha, “perdi dinheiro mas não o sorriso”, confessou ao diário espanhol.

Foi ao olhar para o anúncio de um banco que Dionisio Moreno teve a ideia de “invocar o direito dos consumidores”, conta El País que o descreve como o protagonista silencioso do caso que virou de pernas para o ar o sistema espanhol de despejos e que deu esperança a milhares de pessoas que perderam as suas casas – ou estão em vias de perder – porque não conseguiram pagar as suas dívidas aos bancos.

HOLLANDE É ALVO DE REJEIÇÃO MASSIVA NA FRANÇA




O presidente é o hoje o mais impopular de toda a história da quinta República e nada consegue inverter a curva de queda. Esta semana, François Hollande concedeu uma extensa entrevista na televisão francesa e a única coisa que conseguiu foi ampliar a rejeição: 68% dos franceses consideraram que ele não foi convincente. A análise é de Eduardo Febbro, direto de Paris.

Eduardo Febbro – Carta Maior

Paris – Alguns sentem saudade do ex-presidente conservador Nicolas Sarkozy, 40%, outros detestam o presente do socialista François Hollande, 64%. Nenhuma palavra, nenhuma ação modifica o rumo da rejeição massiva de que é objeto o presidente eleito em maio do ano passado. Hollande é considerado um mau presidente e apenas 21% da população considera sua ação positiva. As sondagens negativas se acumulam junto com as cifras adversas do déficit público, do desemprego, do crescimento estagnado e do poder aquisitivo congelado. Frente à rudeza da crise, a França tem nostalgia de seu antigo chefe de Estado. A adrenalina destruidora de Sarkozy convence mais do que a inteligência, a lentidão pedagógica e o reformismo moderado de François Hollande, O presidente é o hoje o mais impopular de toda a história da quinta República e nada consegue inverter a curva de queda. Esta semana, François Hollande concedeu uma extensa entrevista na televisão francesa e a única coisa que conseguiu foi ampliar a rejeição: 68% dos franceses consideraram que ele não foi convincente.

O chefe de Estado arrasta a sombra de suas próprias contradições e não faz mais do que acentuar essa imagem de indefinição que seus adversários apontam. Na entrevista, François Hollande disse: “agora não sou mais um presidente socialista, mas sim o presidente de todos os franceses”. A frase é de uma ambiguidade destruidora. Renúncia aos ideais? Recuo tático? Posicionamento para a direita? Um enigma que se agrega aos enigmas de uma ação governamental que está longe, muito longe, de ter cumprido com as promessas e as expectativas suscitadas por sua campanha eleitoral. 

Uma vez no poder, o socialismo francês fez o de sempre e chegou mesmo a imitar a direita: correu para o centro, buscou acalmar o apetite dos mercados em uma Europa onde sempre manda o credo liberal da Alemanha, prometeu um arsenal de medidas para simplificar as normas destinadas às empresas e, desde cedo, adotou um histórico plano de austeridade e de controle dos gastos acompanhado por uma política fiscal que fez dos ricos e das empresas sua principal fonte de recursos. Durante sua intervenção na televisão, o presidente deu nome à sua doutrina: já não se chama esquerda socialista ou outra coisa do gênero, mas sim “uma caixa de ferramentas” para resolver a crise. Em uma coluna, o jornal Libération se perguntava há alguns dias: Hollande ainda pode ser chamado de esquerda?

François Hollande dá a impressão de não ser nem de direita, nem de esquerda. Essa ambivalência cobre de sombra os atos positivos do trabalho governamental e lhe valem massivas campanhas de desprestígio na internet: “stop Hollande” ou “presidente catástrofe” são os temos que mais circulam na rede quando se trata do presidente. Quanto postulou sua candidatura para enfrentar Sarkozy, o então candidato Hollande se apresentou como um homem “normal” ante à exuberância sarkozysta. Essa normalidade é agora seu pior atributo. O acusam de ser lento, de não assumir os desafios, de carecer de política visível, de não ter o timão do país nas mãos e de ter renunciado a mudar a sociedade pela esquerda. Hollande é um reformista moderado ao qual falta potência e lirismo para acalmar uma sociedade que, a cada dia, bebe na fonte da crise. O socialismo de Hollande dá sempre a impressão de andar em uma carroça enquanto o país vive pressionado pela velocidade da crise. Suas medidas sempre parecem chegar depois, do mesmo modo que a pedagogia que as acompanha.

Os editorialista reconhecem que a França é um país muito exigente com seus presidentes. Esperam dele que seja, ao mesmo tempo, um pai autoritário e compreensivo, um homem de ação e de reflexão, um mago e um matemático. O semanário “Le Nouvel Observateur” escreveu em sua última edição: “Na França, o presidente deve ser um personagem de novela: as alegações razoáveis não são aceitas. Os franceses são ambíguos: querem coisas concretas e também líricas; querem contar e também sonhar. Querem Sancho Pança e também Dom Quixote”. 

François Hollande não cumpre esses requisitos e a inconsolável França o despedaça. Com uma pedagogia paciente, o presidente explica que sua linha não mudará: reformista, realista e de um pragmatismo que não deixa lugar para o sonho ou as mentiras líricas com que Nicolas Sarkozy acostumou a sociedade. Sarkozy drogava o país com grandes missas cheias de miragens. Hollande recorre à explicação razoável, ao hiper-realismo. Um mentia demasiadamente, o outro se perde em um excesso de razoabilidade. Isso põe o país diante do paredão dos sacrifícios, da austeridade e da missão sem salvação de cumprir com o dever imposto pelo guardião liberal da União Europeia. Até se pode dizer que Hollande é um homem razoável e que a sociedade que ele preside não o é. 

O governo aprovou um aumento considerável dos impostos cujo custo recaiu sobre os mais ricos. Ao mesmo tempo decidiu aplicar cortes drásticos nos gastos para baixar o déficit. A direita exige que ele baixe os impostos, aumente a desregulamentação e suprima os subsídios sociais. A esquerda da esquerda quer mais aumento de impostos para as empresas e os ricos, recusar uma parte da dívida e reativar a economia com uma intervenção massiva do Estado. François Hollande não consegue unir o país em torno de um projeto comum. Os sacrifícios, sem sonhos que os acompanhem, são muito difíceis de digerir. Não há escapatória ao sarcófago liberal que dita os destinos: déficits zero, sonhos zero, perspectivas zero, além da obediência disciplinada e tecnocrática que o liberalismo europeu impõe aqueles que integram esse grande espaço que a cada dia se esvazia mais de seus enunciados humanistas.

Tradução: Katarina Peixoto

O CAMINHO DA FRANÇA, DA ESQUERDA À DIREITA




Emir Sader – Carta Maior, em Blog do Emir

A Europa ocidental protagonizou três décadas – chamadas de “gloriosas” – de Estado de bem-estar social que incluía, entre tantas conquistas, o pleno emprego. Hoje, o desemprego corrói o tecido social, a austeridade impõe recessão e os mais frágeis pagam a conta.

Tudo começou há exatamente 30 anos, quando Mitterrand, depois de governar o primeiro ano com o projeto histórico da esquerda – nacionalizações, Estado indutor do crescimento economia, extensão dos direitos sociais – mudou seu rumo e aderiu ao projeto neoliberal, triunfante sob o comando de Reagan e da Thatcher.

A França dava as costas à solidariedade com os países da periferia, para se transformar em sócio subordinado do bloco anglo-saxão. A social democracia abandonava seu projeto de “democratizar o capitalismo”, para somar-se às posturas de atender às demandas do capital financeiro ascendente.

Esse imenso retrocesso foi possível quando foram sendo abandonados os princípios do Estado de bem-estar social, que supõe um Estado regulador, para a centralidade do mercado, que impõe as necessidades do grande capital.

A França tinha sido, nas décadas desde o pós-guerra, a vanguarda do pensamento progressista no continente, que tinha como contrapartida a presença do movimento operário no plano social e dos partidos socialista e comunista no plano político.

As mudanças radicais no cenário político se deram pela combinação entre o fim do da URSS – referência central para o PCF – e a virada mundial para a hegemonia neoliberal, a que o PSF aderiu. A esse quadro se somou a imigração, que foi profundamente explorada pela direita e, particularmente pela extrema-direita, usando a ideologia chauvinista de rejeição aos trabalhadores imigrantes, que supostamente colocavam em risco a situação dos trabalhadores franceses.

A França, que tinha sido caracterizada por Engels como o “laboratório de experiências políticas”, por 1789, 1848, a Comuna de Paris de 1871, que continuaria no século XX com o governo de Frente Popular nos anos 1930 e pelas barricadas de 1968, mudou radicalmente.

A extrema-direita passou a ser o partido majoritário na classe operária francesa, na frente dos comunistas e dos socialistas.

Foi um elemento a mais da virada ideológica que tornou a França o elo mais conservador na Europa. A comemoração dos 200 anos da Revolução Francesa – como disse Eric Hobsbawn – foi conduzida pelos seus inimigos. Hoje, enquanto nos EUA consegue-se maioria para a posição a favor do casamento dos homossexuais, a França – outrora país dos mais avançados valores – consolida uma posição majoritária contra o reconhecimento do casamento homossexual.

O presidente da França, François Hollande, foi eleito pelo voto anti-Sarkozy, pelo desgaste da austeridade e do estilo demagógico e autoritário do seu antecessor. Mas Hollande não representa uma plataforma antineoliberal, no máximo um descontentamento com a aplicação alemã da austeridade sem contrapontos.

Por isso, Hollande aumentou os impostos, como única medida importante do seu governo. Hoje ele é o presidente francês com menor apoio político – 30% –, depois de ter sido eleito, há 10 meses, com 55%. Recaiu rapidamente sobre ele a maldição da austeridade, que derrota todos os governos que a implementam. A exceção pode ser a Alemanha, onde se realizam este ano as eleições mais importantes da Europa atualmente.

NEO-COLÓNIAS!




Martinho Júnior, Luanda

À medida que a lógica capitalista pervertida pelos detentores de poder e do capital na União Europeia vai colocando a “periferia” na qual Portugal se inscreve numa situação de completa dependência e neo colonialismo, mais a confusão se instala na vida política portuguesa, onde pontificam os mesmos fazedores de opinião conotados ao mesmo círculo social democrata que é um dos grandes actores e responsáveis pela deriva.

Foi esse círculo social democrata que colocou Portugal de forma menos consistente e avisada na Europa, que motivou o povo português a tal “lavando” as suas próprias tendências e acções e, em função da história, é esse mesmo círculo que está apostado em esconder suas responsabilidades na aventura, apesar de estar agora confrontado, como há décadas não acontecia, com os ideais do 25 de Abril!

Nos últimos dias a opinião pública portuguesa está a ser atraída às mesmas ramagens de sempre, as ramagens que “lavam a imagem” da social democracia, uma social democracia que a todo o custo evita discutir o que é essencial a Portugal: o que provocou a situação neo colonial em que o país hoje se encontra!…

…Daí perder-se tanto tempo e “queimarem-se tantas pestanas” com as ramagens do presente, discutindo-se exaustivamente o sexo dos anjos para se fazer esquecer a necessidade de se avaliarem os problemas em função das suas profundas razões históricas e causais, para se fazer esquecer que a social democracia está a levar à promoção de fantoches incapazes de conduzir Portugal a sair do beco que procuraram e do qual não pretendem sair!

Um homem do 25 de Abril, Pedro Pezarat Correia, General do Exército na Reforma e Professor Universitário, reconhece agora precisamente o dilema a que foi conduzido Portugal:

“Há um aspecto que não posso deixar de registar.

Hoje, quando a União Europeia navega em águas agitadas sem rumo perceptível e em que os chamados países periféricos sofrem as consequências de decisões que parecem tudo menos inocentes, é oportuno recordara voz lúcida de Álvaro Cunhal que na altura muitos acusaram de velho do Restelo.

Quando os responsáveis políticos embandeiravam em arco com a adesão à Comunidade Económica Europeia e a entrada no clube dos ricos, quando a maioria do povo português embarcava na euforia da festa das remessas dos fundos estruturais e se empanturrava em betão a troco do abandono da agricultura, da extinção da frota pesqueira, do esvaziamento da marinha mercante, do encerramento de indústrias de base, Álvaro Cunhal alertava e repetia: os portugueses irão pagar isto.

Era ouvido com cepticismo.

Não me excluo, a palavra de Álvaro Cunhal levava-me a reflectir, mas deixava-me dúvidas.

Álvaro Cunhal tinha razão.

Os portugueses estão a pagar isso”.

Pior que isso é que o “exemplo português” está a servir de inspiração a outras opções pelo “mercado”, onde muitos teimam em não compreender que o capitalismo neo liberal é o caminho que irá directamente favorecer as opções próprias do neo colonialismo, que avassala África como nunca, um neo colonialismo moldado à conformidade com os velhos padrões da “FrançAfrique”!

Em África expande-se em direcção ao sul o “arco de crise” com todas as suas componentes de perturbação que conduzem às situações propícias a mais e mais intervenções francesas, a potência colonial que nunca pôs fim ao seu domínio.

Nessa senda, ideologias conservadoras e ultra conservadoras vão ganhando terreno na super estrutura dos frágeis estados, socorrendo-se da contradição entre religiões e dentro do quadro dessas religiões, em especial a islâmica, propícia ao radicalismo salafita…

Reaprender com o movimento de libertação e em função dele está em aberto, em aberto está a trilha da lógica com sentido de vida, mas também em África se vai ficando pelas ramagens, esquecendo-se a necessidade de se avaliarem os problemas em função das suas profundas razões históricas e causais!

A persistência da social democracia em África, ao se aplicarem os mesmos erros de apreciação como em Portugal, como nos países do sul da Europa, trará também, irremediavelmente, profundas clivagens em muitos dos países, a favor dos desequilíbrios sociais, da injustiça e do subdesenvolvimento, enquanto se instalam regimes que fogem até à “democracia representativa” sob o incentivo dos habituais “fazedores de reis”… provavelmente em muitos deles nunca se esteve tão longe do exercício de soberania como agora!

Em África a tendência persiste: cada vez há mais fantoches que assumem o poder, mais saque das riquezas naturais e mais radicais rebeldes que, de acordo com o AFRICOM e a “FrançAfrique”, é imperioso caçar!

Ilustração: Alusão à “FrançAfrique”.


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